Panfletos de Adyar n° 90
O Conde de
Saint-Germain e H.P.B.
Dois Mensageiros da Loja
Branca
H.S.Olcott
Reimpresso de The Theosophist Julho de 1905
Theosophical Publising House,
Adyar, Chennai (Madras), Índia
Junho de 1918
Para mim, uma das figuras mais pitorescas, impressionantes e
admiráveis na história moderna é o fazedor de maravilhas cujo nome intitula este
artigo. O mundo não o vê como um recluso do deserto ou da selva, sujo,
encarquilhado, cabeludo e vestido com farrapos, vivendo à parte de seus
semelhantes e desprovido de simpatias humanas; mas como alguém que entre o
esplendor das mais brilhantes cortes européias igualou-se aos maiores
personagens que se movem no painel da história. Ele sobressaiu-se acima de todos
eles - reis, nobres, filósofos, estadistas e homens de letras, na majestade de
seu caráter pessoal, na nobreza de seus ideais e motivos, na consistência de
seus atos e na profundidade de seu conhecimento, não só dos mistérios da
Natureza, mas também da literatura de todos os povos e épocas. Lendo tudo o que
eu pude encontrar sobre ele, incluindo os instrutivos artigos da Srª
Cooper-Oakley no Theosophical Review (vols. 21
e 22), passei a amá-lo e também admirá-lo; amá-lo como amava H.P.B.
[Helena Petrovna Blavatsky]; e pela mesma
razão - pois ele foi um mensageiro e agente da Loja Branca, cumprindo sua missão
com altruística lealdade e fazendo para beneficiar os outros tudo o que cabe
dentro do poder humano.
A
recente leitura de uma memória biográfica sob a forma de um romance histórico,
do famoso Souvenirs do Barão de Gleichen; de um interessante artigo no
volume 6 do Le Lotus Bleu; do artigo sobre o Conde na Encyclopaedia
Britannica, e noutras publicações, reavivou todas as minhas lembranças do
que eu ouvira sobre ele, e, mais importante ainda, persuadiu-me de sua
identidade com um dos mais encantadores dos Personagens Invisíveis que
permaneceram por trás da máscara de H.P.B. durante a escrita de Ísis sem Véu.
Quanto mais eu penso nisso, mais completamente me convenço da verdade desta
suposição.
Antes
de entrar nesses detalhes, contudo, será bom simplesmente dizer que um dia, no
século XVIII, ele apareceu na França sob o nome mencionado acima. É dito que ele
o havia tomado de uma propriedade comprada por ele no Tirol. A Srª Cooper-Oakley
dá, baseada na autoridade da Srª. d-Adhémar, uma lista dos diferentes nomes sob
os quais este fazedor de época foi conhecido, desde o ano 1710 até 1822. Cito os
seguintes: Marquês de Montferrat, Conde Bellamare, Cavaleiro Schoening,
Cavaleiro Weldon, Conde Soltikoff, Conde Tzarogy, Príncipe Ragoczy, e
finalmente, Saint-Germain. A Srªa Oakley, com a ajuda de amigos, procedeu a uma
industriosa pesquisa nas bibliotecas do Museu Britânico e noutras de diversos
reinos europeus. Ela pacientemente reuniu, de várias fontes, fragmentos de
história que identificariam o grande Conde com os personagens conhecidos sob
estes diferentes títulos. Mas é aceito por todos os que escreveram sobre ele que
o verdadeiro segredo de seu nascimento e sua nacionalidade jamais foi
descoberto; todas as diligências das autoridades policiais de diferentes países
resultaram somente em fracasso. Um outro fato de grande interesse é o de que
nenhum crime nem intenção criminosa nem fraude jamais foram provados contra ele;
seu caráter era inatacável, seus propósitos, sempre nobres. Embora vivendo no
luxo e parecendo possuir uma riqueza inesgotável, ninguém jamais pôde saber de
onde vinha seu dinheiro; ele não mantinha contas em banco, não recebia ordens de
pagamento, não desfrutava de pensão de nenhum governo, recusou todas as ofertas
de presentes e benefícios feitas a ele pelo Rei Luís XV e por outros soberanos,
mas ainda assim sua generosidade era principesca. Aos pobres e miseráveis, aos
doentes e oprimidos, ele era uma encarnação da Providência; entre outros
benefícios públicos, fundou um hospital em Paris, e possivelmente outros em
outros lugares.
Grim,
em sua celebrada Correspondance Littéraire, que é descrita pela
Britannica como "o mais valioso registro remanescente de algum período
literário de importância", afirma que Saint-Germain era "o homem mais ilustrado
que ele jamais vira". Ele conhecia todas as línguas, toda a história, toda a
ciência transcendental; não aceitava presentes ou patrocínios, e recusava todas
as ofertas disto, dava prodigamente, fundou hospitais, e trabalhava sempre, e
sempre arduamente, pelo benefício da raça. Alguém poderia pensar que um homem
como este poderia ter sido poupado pelo maledicente e pelo caluniador, mas não
foi; enquanto ainda vivia e desde sua morte (ou antes desaparecimento) os mais
reles insultos têm chovido sobre sua memória. Diz a Britannica que ele
foi "um célebre aventureiro do século XVIII que assegurando ter descoberto
alguns segredos extraordinários da natureza exerceu considerável influência em
diversas Cortes européias. (...) Era dito comumente que ele obtinha seu dinheiro
desempenhando as funções de espião para uma das Cortes européias".
A
mesmíssima opinião sobre ele é ecoada por Bouilferet em seu Dictionnaire
d-Histoire et de Geographie, e por diversos outros escritores.
Temos
várias descrições da aparência pessoal do Conde de Saint-Germain, e embora elas
difiram um pouco nos detalhes, todas o descrevem como um homem de saúde
radiante, e de inalterável cortesia e bom-humor. Suas maneiras eram a perfeição
do refinamento e da graça. Ele parece ter sido um lingüista notável, falando
fluentemente e usualmente sem sotaque estrangeiro as línguas correntes da
Europa. Um escritor, assinando-se Jean Léclaireur, diz em um interessante artigo
sobre O Segredo do Conde de Saint-Germain, no Lotus Bleu, vol. VI,
314-319, que ele estava familiarizado com o francês, inglês, italiano, espanhol,
português, alemão, russo, dinamarquês, sueco e muitos dialetos orientais. Sua
maestria nestes últimos fornece um dos pontos de semelhança que são tão
extraordinários entre ele e H.P.B., pois Sua Alteza, o falecido Príncipe Emil de
Sayn-Wittgenstein, Adido do Corpo Diplomático junto ao Imperador Nicolau e um
antigo membro de nossa Sociedade, uma vez escreveu-me que quando ele conheceu
H.P.B. em Tiflis, ela era famosa por sua habilidade de falar a maioria das
línguas do Cáucaso - geórgio, mingreliano, abásio, etc, enquanto que nós mesmos
a temos visto produzir literatura de qualidade superior em russo, francês e
inglês. Mas quanto mais se lê sobre Saint-Germain e se conhece sobre H.P.B.,
mais numerosas e notáveis são as semelhanças entre os dois grandes ocultistas. A
Srª Cooper-Oakley em sua cuidadosa compilação diz (Theosophical Review,
vol. XXI, p. 428): "Era consenso quase universal que ele tinha uma graça e
cortesia de maneiras encantadoras. Ele apresentava em sociedade, além disso, uma
grande variedade de dons, tocava vários instrumentos musicais excelentemente, e
às vezes demonstrava faculdades e poderes que beiravam o misterioso e o
incompreensível. Por exemplo, um dia ele lhe tinha ditado os primeiros vinte
versos de um poema, e os escreveu simultaneamente com ambas as mãos em duas
folhas separadas de papel - e ninguém presente poderia distinguir uma folha da
outra".
O Sr.
Léclaireur, no artigo supracitado, sumarizou muitos pontos sobre o Conde de
Saint-Germain que corroboram a citação e parecem ter sido cuidadosamente
compilados da literatura sobre o assunto. Ele diz que "sua beleza era notável e
suas maneiras esplêndidas; ele tinha um extraordinário talento para a elocução,
uma educação e erudição maravilhosas. (...) Músico completo, ele tocava todos os
instrumentos, mas agradava-o mais o violino; ele o fazia soar tão divinamente
que duas pessoas que ouviram a ele e depois ao afamado mestre italiano Paganini
colocaram ambos no mesmo nível". Aqui lembramos a soberba facilidade de H.P.B.
como pianista, seu toque ligeiro, sua capacidade improvisativa e seu
conhecimento da técnica. O Barão Gleichen cita-o dizendo assim: "Vocês não sabem
do que estão falando; só eu posso discutir este assunto, o qual já esgotei, como
o fiz com a música, que abandonei porque nela não podia ir mais além". O Barão
foi convidado à sua casa com o objetivo declarado de examinar algumas pinturas
muito valiosas, e o Barão diz que "ele manteve a palavra, pois as pinturas que
ele me mostrou tinham o caráter de singularidade ou de perfeição, que as fazia
mais interessantes que muitas das pinturas de primeira linha, especialmente uma
Sagrada Família, de Murillo, que igualava em beleza a de Rafael em
Versalhes; mas ele me mostrou muito mais que isso, a saber: uma quantidade de
gemas, especialmente diamantes, de cores, tamanho e perfeição surpreendentes. Eu
pensei que estava contemplando os tesouros de Aladim. Dentre outras havia uma
opala de tamanho monstruoso e uma safira branca tão grande quanto um ovo, que
empalideceu todas as gemas que eu coloquei ao lado para comparar. Suponho ser um
conhecedor de jóias, e declaro que o olho não poderia descobrir a menor razão
para duvidar da qualidade destas pedras, ainda mais que não estavam
engastadas".
Muitos
anos atrás minha irmã, Srª. Mitchell, sentindo-se indignada pelas calúnias
baixas que estavam circulando contra H.P.B. e mim mesmo, e desejando deixar
registrado um relato de alguns dos fatos que foram observados por ela própria
enquanto ocupava, com seu marido e filhos, um apartamento no mesmo edifício que
o nosso, publicou em um jornal londrino um artigo no qual citava, entre outros,
o seguinte incidente: "Um dia ela disse que me mostraria algumas coisas belas, e
indo até uma pequena escrivaninha que ficava debaixo de uma das janelas, pegou
dela muitas peças de soberba joalheria; broches, pregadores, braceletes e anéis,
que estavam cravejados com todos os tipos de pedras preciosas, diamantes, rubis,
safiras, etc. Eu as peguei e examinei, mas pedindo para vê-las no dia seguinte
só encontrei gavetas vazias". Minha irmã pensou que elas deviam valer bem muitos
milhares de dólares. Mas como aconteceu de eu saber que H.P.B. não tinha nenhuma
coleção de pedras preciosas como esta, nem mesmo uma pequena parte delas, minha
única inferência possível é a de que ela havia forjado para a visão de minha
irmã uma daquelas ilusões ópticas que ela descrevia como truques psicológicos.
Sou inclinado a acreditar que Saint-Germain fez o mesmo com o Barão Gleichen. Na
verdade, estes fazedores de maravilhas podem ao bel prazer transformar uma
ilusão em realidade e fazer as pedras sólidas e permanentes. Tomemos por exemplo
meu "anel da rosa" (vide O.D.L., I, 96) que ela primeiro fez surgir a partir de
uma rosa que eu segurava na mão, e, dezoito meses mais tarde, quando minha irmã
o usava, fez com que três pequenos diamantes aparecessem engastados no ouro, em
forma de triângulo. Muitas pessoas em diferentes países viram este anel, e
algumas me viram escrever com ele sobre vidro, provando assim que as pedras são
diamantes genuínos. O anel ainda está em meu poder, e durante estes trinta anos
não mudou em nada suas características. Além disso, há os casos de sua
duplicação de um diamante amarelo para o Sr. Sinnett em Simla, de safiras para a
Srª. Carmichael e outros amigos de diversos lugares, sua produção do seu místico
anel de sinete, agora de posse da Srª. Besant, ao esfregar entre suas mãos meu
próprio anel de sinete gravado; e as híbridas pinças para cubos de açúcar de
prata, e, primeiro e último, muitos artigos de metal e pedra que, tendo sido
devidamente descritos em meu O.D.L., não precisam ser recapitulados aqui. O
leitor verá que os respectivos fenômenos de Saint-Germain e H.P.B.
complementam-se e se corroboram mutuamente, e demonstram que entre os ramos da
ciência oculta que são familiares aos adeptos e seus discípulos avançados deve
ser incluído um conhecimento íntimo e controle do reino mineral. Saint-Germain
contou a alguém que ele havia aprendido de um velho Brâmane hindu como "reviver"
o carbono puro, isto é, como transmutá-lo em diamante; e Kenneth Mackenzie é
citado como dizendo (na sua Royal Masonic Cyclopaedia, p. 644): "Em 1780,
durante sua visita ao embaixador francês em Haia, ele despedaçou com um martelo
um soberbo diamante que havia produzido por meios alquímicos; uma pedra gêmea
desta, também feita por ele, vendeu-a a um joalheiro pelo preço de 5.500 luíses
de ouro". |