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OS
ENSINAMENTOS DE JESUS E A TRADIÇÃO ESOTÉRICA CRISTÃ
ATENÇÃO
A falta de
atenção do ocidental é notória. Quantas vezes não entendemos o que
alguém está nos dizendo porque estamos pensando em outra coisa enquanto
o outro está falando. O desenvolvimento da atenção em todas as
atividades de nossa vida cotidiana não só servirá para tornar-nos mais
eficientes no que tivermos que realizar, mas também facilitará o
desempenho de nossa meditação. A inabilidade em manter a plena atenção
é uma das principais razões porque os ocidentais têm mais dificuldade
para meditar do que os orientais.
Mas a
atenção também é necessária para evitar que cometamos deslizes na
vida. Jesus já dizia: ?Vigiai e
orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto,
mas a carne é fraca? (Mt. 26:41). Se não estivermos atentos às
circunstâncias de nossa vida, analisando as implicações de diferentes
cursos alternativos de comportamento, podemos nos deixar levar pelos
nossos condicionamentos, geralmente expressando tendências materiais e
egoístas. O cuidado e a atenção são especialmente importantes no que
se refere às instruções espirituais. No Antigo Testamento encontramos
diversas passagens a este respeito, como por exemplo:
?Se
aceitares, meu filho, minhas palavras e conservares os meus preceitos,
dando ouvidos à sabedoria, e inclinando o teu coração ao entendimento;
se invocares a inteligência e chamares o entendimento; se o procurares
como o dinheiro e o buscares como um tesouro; então entenderás o temor
de Iahweh e encontrarás o conhecimento de Deus? (Prov 2:1-5).
?Meu
filho, sê atento às minhas palavras; dá ouvidos às minhas sentenças:
não se afastem dos teus olhos, guarda-as dentro do coração. Pois são
vida para quem as encontra, e saúde para a sua carne. Guarda o teu
coração acima de tudo, porque dele provém a vida? (Prov
4:20-23).
?Deus
fala de um modo e depois de um outro, e não prestamos atenção. Em
sonhos ou visões noturnas, quando a letargia desce sobre os homens
adormecidos em seu leito: então lhes abre os ouvidos, e os aterroriza com
aparições, para afastar o homem de suas obras e pôr-lhe fim ao orgulho,
para impedir sua alma de cair na sepultura e sua vida de cruzar o Canal?
(Jó 33:14-18).
Alguns
autores da tradição cristã sugerem que a atenção é um elemento
fundamental da prática espiritual. Theophanis, o recluso, escreveu: ?A vida de atenção, levada a fruição em Cristo Jesus, é o pai da
contemplação e do conhecimento espiritual (gnosis). Ligada à humildade,
ela gera a exaltação divina e pensamentos do tipo mais sábio.?[1]
Entre os
padres da igreja primitiva falava-se da interdependência da atenção e
da prece, que se unem na luta contra o orgulho, levando à humildade, que
por sua vez abre o coração aos poderes do alto. S. Hesychios, o Padre,
escreveu: ?Se nosso intelecto é
inexperiente na arte da atenção, ele começa imediatamente a entreter
todas as fantasias intensas que nele aparecem, importunando-o com
perguntas ilícitas e respondendo-as de forma ilícita. Então, nossos
próprios pensamentos juntam-se à fantasia demoníaca, que cresce e se
expande até que parece ser maravilhosa e desejável para o intelecto
acolhedor e despojado.?[2]
A atenção
pode ser enfocada sob dois aspectos: o que os budistas chamam de ?plena
atenção? e a técnica da ?auto-observação.? Esses dois aspectos
são de capital importância no caminho espiritual.
O importante
em ambos aspectos é o direcionamento de nossa atenção. Na maior parte
dos exercícios o que é preciso é o unidirecionamento da atenção, no
que poderíamos chamar de concentração. As atividades do mundo e a
meditação analítica demandam essa concentração. No entanto, em certas
situações, em vez de concentrar o foco da atenção, é preciso
justamente o contrário, expandir ao máximo o foco da atenção para que
ela abarque tudo o que possa estar ocorrendo ao nosso redor. Em certos
tipos de meditação, o meditador deve permanecer atento a todos os
pensamentos que passam por sua tela mental sem, porém seguir ou apegar-se
a nenhum deles. Numa volta mais elevada da técnica meditativa, o objetivo
é a contemplação que requer perfeita aquietação da mente. Para que
isso ocorra, a mente deve ser pacientemente treinada.
A plena
atenção voltada para o aqui e agora de cada atividade que está sendo
realizada é a melhor disciplina da mente, para que durante o período
meditativo ela possa ser naturalmente direcionada a um determinado objeto,
e firmemente mantida durante o tempo necessário para analisar tudo o que
for possível pela lógica. Se o meditador continuar a manter a atenção
no objeto, poderão surgir inspirações
reveladoras vindas da pura luz da intuição.
O exercício
da plena atenção é tão fundamental para a prática budista que eles
costumam dizer, com sua alegria costumeira, que a diferença entre eles e
os não-praticantes é que quando eles caminham eles caminham, quando
comem eles comem, quando meditam eles meditam, etc. A explicação dessa
aparente tautologia é que um praticante budista procura voltar toda a sua
atenção para o que está sendo realizado, evitando que a mente divague
enquanto está fazendo alguma coisa.[3]
Como parte do treinamento da mente, os iniciantes são instados a praticar
a concentração sobre a respiração como uma técnica meditativa
básica. Alguns praticam a meditação ao caminhar lentamente, procurando
concentrar-se em todos os movimentos; o mesmo é feito ao comer, com a
concentração em cada movimento da mão, do maxilar, etc.
Dois autores
budistas contemporâneos escreveram a esse respeito:
?Quando
de pé, andando, sentados ou deitados, durante todo o tempo em que
estivermos acordados, deveremos desenvolver a plena atenção mental e o
amor universal. Isso, dizem, é a mais elevada conduta aqui.?[4]
A atenção
está relacionada aos sentidos e à mente. O grau mais elevado de
atenção é aquele em que a mente está engajada, pois é a mente que
sintetiza os sentidos. Mas existe um nível ainda mais elevado de
atenção, que é a atenção relacionada aos sentidos espirituais. É
para esse nível de atenção que Paulo parecia estar se reportando quando
escreveu: ?Não olhamos para as coisas que se vêem, mas para as que não se vêem;
pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno? (2
Cor 4:18)
A atenção
é geralmente relacionada na Bíblia como vigilância, daí as várias
passagens em que os fiéis são instados a vigiar. Uma passagem merece ser
citada em virtude de suas implicações esotéricas:
?Felizes
os servos que o senhor, á sua chegada, encontrar vigilantes. Em verdade
vos digo, ele se cingirá e os colocará à mesa e, passando de um a
outro, os servirá? (Lc 12:37).
Usando as chaves para a interpretação dos textos sagrados sugeridas anteriormente, podemos assumir que o sentido esotérico da passagem é interior. O senhor é o Eu Superior. Os servos são os veículos inferiores. Felizes, pois, as almas cujos veículos inferiores estiverem vigilantes quando a Graça da chegada consciente do Cristo interior ocorrer. Nesse caso o senhor colocará estas almas à mesa e as servirá com o banquete celestial da sagrada Comunhão.
[1] St. Theophanis, o recluso, Four Sermons on Prayer, citado por R. Amin, A Different Christianity, op.cit., pg. 276.
[2]
St. Hesychios the Priest, em The
Philokalia (London: Faber and Faber, 1979), vol. I,
pg. 187.
[3]
Uma passagem do Dhammapada ilustra a importância da vigilância, ou plena
atenção, para os budistas: ?A
vigilância é o caminho da imortalidade, o Nirvana. A negligência é
o caminho da morte. Os vigilantes não perecem; os negligentes já
estão como mortos.? Op.cit., pg. 21.
[4]
Georges da Silva e Rita Homenko, Budismo:
Psicologia do Autoconhecimento (S.P.: Pensamento), pg. 147.
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