A
Fraternidade do Yucatán
Annie Besant
O impulso que
deu origem ao espiritismo procedeu, como muitos sabem, da Loja Branca, por
mediação de alguns iniciados e discípulos da quarta raça; e precisamente o
caráter particular daquele movimento se deveu à intervenção destes agentes.
Também conhecem muitos a existência da chamada “Fraternidade do Yucatán” no
México, grupo muito importante, que descende em definida sucessão da quarta
raça, para manter os métodos de progresso oculto que lhe eram peculiares.
Têm uma
missão especial relacionada com a quarta raça, que compreende a maioria da
humanidade existente hoje em nosso globo. Esquecemos muitas vezes este fato,
considerando a quinta raça, a que pertencemos, como a principal do mundo,
embora não obstante ser hoje a que dirige a evolução, constitui uma minoria da
humanidade encarnada, sendo regra geral do progresso que uma minoria esteja à
cabeça e que gradualmente os outros vão alcançando seu nível, enquanto adianta
a minoria. Do mesmo modo, os indivíduos mais avançados da quinta raça passarão
à sexta, e a quinta será no futuro a maioria da humanidade encarnada, assim
como a quarta (conforme atualmente acontece com a terceira) será minoria de
atrasados do grosso do exército em marcha.
É, pois,
importante o papel que representa na evolução do mundo a “Fraternidade do Yucatán”,
correlacionada em particular com a evolução da quarta raça. Seus métodos são
mais adequados a esta raça e se distinguem dos que adota a Grande Loja Branca
para a evolução da quinta.
Isto não quer
dizer que os membros da Loja Branca não tenham passado pela quarta raça, pois
todos passaram por ela; mas agora se servem de corpos de sistema nervoso muito
mais delicado e muito diferentes dos daquela, como os corpos dos que encarnaram
na decadência da quarta raça, guiados pela Loja Branca de então, e adotaram os
métodos adequados para salvar à quinta raça da grande catástrofe da Atlântida,
na qual pereceu a maioria da quarta. Não obstante, como dissemos antes, hoje
ainda a quarta raça constitui a maioria e a Fraternidade oculta do Yucatán deve
cuidar especialmente de sua evolução. Os métodos adotados por esta fraternidade
seguem sendo os mesmos do remoto passado, relacionados com o que agora chamamos
“psiquismo inferior”, que consta de uma série de fenômenos ocultos tangíveis,
pertencentes ao plano físico, de modo que neste mesmo plano se podem ter provas
da realidade dos mundos superiores.
Este tinha
sido sempre o objetivo daqueles métodos especiais, mas deles nasceu certa
tendência a materializar a religião. Os fiéis mostravam mais interesse pelos
fenômenos que pelo aspecto espiritual dos fatos e procuravam provas das coisas
espirituais com base em feitos materiais. Por isso se deixaram ditos métodos
exclusivamente em mãos de quem os preferia como mais eficazes, enquanto se
traçava para a quinta raça um senda mais difícil, embora mais segura, na qual o
conhecimento devia adquirir-se em harmonia com a evolução da mente e não com a
dos afetos e paixões. Os homens da quinta raça deviam passar pela inteligência à
mais elevada intuição, ou, como às vezes se diz, ao “psiquismo superior”.
Entretanto,
quando se viu que também os indivíduos mais adiantados da quinta raça, os que
pertenciam ao mundo científico, encaminhavam-se para o grosseiro materialismo,
e que o progresso do conhecimento intelectual era muito mais rápido que o da
consciência social e moral, reconheceu-se a necessidade de iniciar um novo
movimento que pudesse atrair aos materialistas e lhes dar alguma prova tangível
no mundo físico, da realidade do mundo invisível (superfísico embora não espiritual).
Assim nasceu o movimento espírita, caracterizado no mundo ocidental por
fenômenos que se prestavam à indagações físicas, como produção de golpes,
movimento rítmico de objetos sólidos, cadeiras, mesas ou qualquer outro objeto
que pudesse mover-se com facilidade. Mas adiante houve manifestações de vozes
audíveis e depois fenômenos de “materialização” em que indivíduos revestidos de
seu corpo astral, depois de ter abandonado temporária ou definitivamente seu
corpo físico, tomavam emprestada de outras pessoas, dotadas de constituição
especial, parte do corpo etéreo ou também parte do corpo físico, de modo que
seus corpos astrais vitalizados e, por assim dizer, condensados por esta
espécie de agregado material, podiam fazer-se perceptíveis à vista ordinária.
Este método,
não obstante seus inconvenientes, era o único adequado ao caso, e por isso foi
escolhido para afastar a catástrofe da difusão geral da ciência materialista
que naquele tempo preponderava na vida intelectual do mundo.
A “Fraternidade
do Yucatán”, para a qual aquele método era familiar desde muito remoto tempo,
assumiu a direção deste movimento regenerador. Nos primeiros tempos da
Sociedade Teosófica, também seus Mestres se faziam visíveis algumas vezes por
este método, e outras vezes falavam ou ensinavam por meio do H. P. Blavatsky,
que estava dotada de um corpo extremamente mediúnico, devido à mescla de sangue
tártaro da quarta raça, em seu corpo encarnado na Rússia. Durante os anos de
instrução que passou sob a guia de um Mestre da Loja maçônica Branca, que a fez
chegar a um muito alto grau de conhecimento e de poder, aprendeu o modo de
utilizar seu corpo dominando-o de maneira que ninguém pudesse valer-se dele,
exceto os que ela consentia.
Precisamente
esta combinação de um corpo mediúnico com grande conhecimento oculto fez da
senhora Blavatsky um personagem tão enigmático para seus contemporâneos, e que
(como disse dela um Mestre) dava-lhe o caráter “da mais maravilhosa
individualidade psíquica nascida em dois séculos”. Seu gradual desenvolvimento
bem dirigido e com seus altos poderes pôde ser utilizado pelos Mestres como médium
no mundo físico.
As pessoas de
natureza sensitiva necessitam uma disciplina bem dirigida, porque, se deixadas
abandonadas a si mesmas e sem o necessário conhecimento, não podem proteger-se
nem escolher a entidade a quem consentir o uso de seu corpo. Antigamente essas
pessoas estavam protegidas pelos sacerdotes dos templos, e eram as sibilas e as
vestais da religião pagã. Então se cuidava escrupulosamente de que não tivessem
contato com o mundo externo e só muito poucos podiam aproximar-se delas. Mas
quando os sensitivos nascem em um mundo ignorante do ocultismo, expostos a
todas as dificuldades inerentes à falta de amparo externo, convertem-se nos médiuns
ordinários de nossos dias, absolutamente incapazes de proteger-se por si
próprios.
Estão
expostos a toda influência do mundo astral e etéreo, e por isso com grande
facilidade ficam em contato com desencarnados de pouca elevação espiritual e
com a massa de entidades ordinárias e medíocres que povoam os sub-planos inferiores do mundo astral.
Enquanto alguns Mestres da “Fraternidade do Yucatán”
guiavam cuidadosamente a seus discípulos especiais, a fim de dar por seu meio
ensinos de ordem elevada, muitos médiuns estavam completamente
abandonados a si mesmos, salvo o caso de que algum desencarnado bem disposto,
atraído para eles por alguma boa qualidade, os protegesse até certo ponto,
impedindo o acesso das malignas influências de seres do mundo astral inferior.
Em nossos dias o materialismo não é tão potente como nos
primeiros tempos do movimento espírita, quando a maioria dos chamados “guias” mediúnicos
eram índios da América do Norte. Isto caracterizou a primeira fase do
espiritismo, e ocorreu primeiro nos Estados Unidos, onde abundavam os
indivíduos aptos para este uso. Vemos, com efeito, que serviam de “guia” aos
primeiros “médiuns” muitos peles-vermelhas desencarnados, que muitas vezes
tinham nomes estranhos como; “Raio de sol” e outros pelo estilo; e quando se
materializavam, apareciam em sua figura característica. Muitas vezes eram
meninos ou meninas.
Houve depois uma série de manifestações de não já
peles-vermelhas mas sim de gente do mesmo estilo, cujas comunicações
demonstravam ignorância e pouca elevação. Com estas comunicações grosseiras se
mesclavam às vezes algumas de grande valor, provenientes de algum membro da “Fraternidade
do Yucatán”, ou também em raras
ocasiões, da Loja Branca. O caso do Stainton Moses é um exemplo destas raras
exceções. Era este homem de grande inteligência, de espírito crítico e
indagador e sempre cheio de dúvidas, distinto portanto dos médiuns ordinários,
que devem ser sempre passivos. Por causa de sua alta intelectualidade pôde
servir para manifestações elevadas, e alguns ensinos dados por seu meio são
muito apreciadas. Por alguns outros médiuns americanos chegaram ao mundo
ensinos muito formosos.
Pode-se dizer que em conjunto as mensagens que vieram ao
mundo por este método foram de muita formas de utilidade e importância. O
valor real do espiritismo foi dar provas tangíveis da vida post mortem, por
isso homens como Sir William Crookes puderam em seus próprios laboratórios e
aplicando os mais escrupulosos métodos de indagação científica, obter provas
positivas de seres estranhos à existência física. Consultando os relatos do
Crookes se vê com quanta sagacidade científica levou a cabo suas investigações,
descobrindo uma modalidade especial de luz, que, a diferença da luz ordinária,
não desintegra os corpos “materializados”.
Também descobriu o procedimento de pesar os corpos
materializados, etc. Ainda empregam estes procedimentos na França e na Itália
os que se dedicam às ciências psíquicas, que se converteram do materialismo ao
espiritismo, embora não queiram se chamar “espíritas” pela aversão que têm a
este nome. Entretanto, publicaram sérios e interessantes relatos de suas
investigações, e entre eles se contam Richet e De Rochas na França (os dois
muito influenciados pela Teosofia) e Lombroso na Itália, que obteve uma série
muito notável de provas em sessões mediúnicas. Estas provas dadas por eminentes
cientistas deveriam bastar para convencer aos intelectuais se tomassem o
trabalho de as examinar; mas geralmente os cientistas não se dignam fazê-lo. A Royal
Society de Londres segue negando toda validade às indagações de Crookes, ao
ponto que este correu o risco de expulsão por ser um supersticioso e dedicado a
investigações ilícitas. De qualquer forma publicou o relatório das provas
obtidas cuja validade segue sustentando ainda hoje; e Sir Oliver Lodge seguiu,
até certo ponto, os rastros de Crookes. Enquanto o espiritismo seguiu a direção
que lhe tinha atribuído, emprestou muito bons serviços que ainda subsistem,
porque, além de toda questão de valor moral ou de desenvolvimento espiritual, é
o único método que oferece provas físicas de feitos superfísicos. Quem se dita
a seguir seus métodos pode obter, como em qualquer ciência ordinária, as provas
desejadas, conforme efetuaram muitos cientistas, entre eles o já mencionado Sir
Oliver Lodge, o qual recentemente publicou uma notável obra intitulada “Raymond”,
em que as comunicações de um filho dele, morto em uma das batalhas da atual guerra(1),
provaram-lhe a existência post mortem.
É muito natural que se apresentem nestes tempos numerosas possibilidades
para estas investigações. Milhares e milhares de jovens deixam a vida terrena
no pleno vigor de sua idade e não podem adentrar rapidamente ao mundo
devacanico. Como se sabe, a morte repentina engendra por si um carma especial e
além disso as condições do mundo astral estão agora grandemente modificadas
pela irrupção súbita de tantas almas que não seguem a regra geral (embora
verdadeiramente tivesse sido melhor para elas, a não ser que não tivessem
alcançado um alto grau de desenvolvimento) ou seja de passar por um período de
inconsciência e recolher todas as experiências úteis de sua vida para as levar
consigo ao devacan e ali as transmutar em novas faculdades. Contrariamente,
agora também as pessoas que morrem normalmente ficam detidas no plano astral
para realizar trabalhos especiais. Muitíssimos (também entre vós que me
escutais) não passarão à vida devacanica (pelo menos se deixarem a terra dentro
de poucos anos) e preferirão voltar em seguida para a terra para encontrar-se
com o Senhor Maitreya quando vier, ou para cooperar ao imenso trabalho que terá
que levar-se a cabo quando Ele deixar o mundo nas condições por Ele
estabelecidas, mas que terão que ser fortalecidas e cada vez mais amplificadas.
Aparecido em “The Theosophist” de Maio de 1917, e traduzido
para “O lótus Branco”, de Março 1918, por Atilio Bruschetti.
Notas
(1)
Este artigo foi escrito durante a Primeira guerra mundial.