O mistério envolve os homens que
passam suas vidas a serviço da humanidade e
mantêm-se extremamente dedicados somente aos seus superiores. Os padrões
de julgamento social e a moralidade convencional não podem ser separados de
seus caracteres. O mistério que envolve Alessandro, Count di Cagliostro, foi
montado por boatos e calúnias sem fundamento a uma tal extensão que, “Sua
história aceita é muito bem conhecida para precisar ser repetida, e sua verdadeira história nunca foi
contada”. A pesquisa conscienciosa tem dissipado as nuvens dos boatos e da
difamação o suficiente para revelar à análise imparcial uma vida nobre permeada
com sabedoria e envolvida pela compaixão.
“Não posso”, testemunhou Cagliostro, “falar positivamente
com relação ao lugar onde nasci, nem dos pais de quem nasci”. Seus inimigos
diziam que ele era José Balsamo, um famoso aventureiro e criminoso da Sicília,
mas suas palavras e atos negam essa identificação. Ninguém que reconhecesse
Balsamo veio a público para estabelecer a relação. De acordo com o próprio
Cagliostro, ele viveu como uma criança chamada Acharat no palácio do Mufti
Salahayyam em Medina. Seu governador, um Adepto Oriental chamado Althotas,
disse-lhe que ele nascera de nobres pais cristãos, porém se recusou a falar
mais. Referências casuais, contudo, levaram Cagliostro a acreditar que ele
nascera em Malta. Althotas tratava-o como um filho e cultivava sua aptidão para
as ciências, especialmente botânica e química. Cagliostro aprendeu a respeitar
a religião e a lei em cada cultura e região. “Ambos nos vestimos como
Maometanos e estamos externamente de
acordo com a devoção do Islam, mas a verdadeira religião foi impressa em nossos corações”. Quando
criança, aprendeu os idiomas árabe e orientais e também muito sobre o Egito antigo.
Aos doze anos, Althotas levou-o a
Mecca, onde permaneceram por três anos. Quando Acharat encontrou o Sharif,
ambos imediatamente sentiram uma forte ligação e choraram na presença um do
outro. Embora passassem muito tempo juntos, o Sharif recusou-se a discutir a
origem de Acharat, embora uma vez o tivesse avisado de que “se algum dia eu
deixasse Mecca, estaria ameaçado com as maiores infelicidades, e acima de tudo
ordenou-me cautela com a cidade de Trebizond”. A uniformidade da vida no palácio
falhou em saciar a sede por conhecimento e experiência de Acharat e a tempo ele decidiu ir para o Egito com
Althotas. Na hora da partida, o Sharif despediu-se dele chorando, com as
palavras, “Filho infeliz da natureza, adeus”.
No Egito, ele aprendeu que as
pirâmides continham segredos desconhecidos pelo turista. Foi admitido pelos
sacerdotes do templo “a lugares tais,
que nenhum outro viajante comum jamais havia entrado antes”. Após três anos de
viagem “pelos principais reinos da África e da Ásia”, ele chegou a Rhodes em
1766, onde pegou um navio francês para Malta. Enquanto estava hospedado no
palácio de Pinto, Grão Mestre de Malta, o Cavalheiro d’Aquino de Caramanica
apresentou-o à ilha. “Foi aqui que eu
pela primeira vez assumi o modo de vestir Europeu e com ele o nome de Conde
Cagliostro”. Althotas apareceu com a roupa e a insígnia da Ordem de Malta.
“Tenho todas as razões para
acreditar que o Grão Mestre Pinto estava familiarizado com minha verdadeira
origem. Freqüentemente me falava do
Sharif e mencionava a cidade de Trebizond, porém jamais consentiria em entrar
em outros detalhes particulares sobre o assunto.”
Com base nesta referência, alguém
especulou que Cagliostro era o filho do
Grão Mestre Pinto e uma nobre senhora de Trebizond, mas Cagliostro, ele mesmo,
jamais expressou esta opinião. Enquanto ainda em Malta, Althotas faleceu.
Minutos antes de sua passagem, ele declarou a Cagliostro: “Meu filho, conserve
para sempre diante de seus olhos o temor a Deus e o amor de suas pequenas
criaturas; logo você estará convencido, pela experiência, de tudo aquilo que
tenho lhe ensinado”.
Com a permissão relutante do Grão
Mestre, Cagliostro deixou Malta na companhia do Cavalheiro d’Aquino para a
Sicília, as Ilhas Gregas, e finalmente, Nápoles, o lugar natal do Cavalheiro.
Enquanto o Cavalheiro se ocupava com assuntos pessoais, Cagliostro prosseguiu
para Roma. Retirou-se para um apartamento para melhorar seu italiano, mas logo
o cardeal Orsini solicitou sua presença
e, através dele, conheceu vários cardeais e príncipes romanos.
Em 1770, com a idade de vinte e
dois anos, ele conheceu e se apaixonou por Seraphina Feliciani. Embora ela
fosse a dona do seu amor e devoção pelo resto de suas vidas, ela nunca foi
capaz de totalmente romper com a Igreja e seria usada como “a ferramenta dos
Jesuítas”. Aconteceu que a natureza de Cagliostro, boa ao extremo, e a total
confiança que colocava em seus amigos
foram a causa de seus desapontamentos.
A generosidade de Cagliostro logo esgotou suas fontes e o casal foi desfeito
quando viajavam para visitar amigos em Piemonte e Genova. Mas em julho de 1776,
quando chegaram a Londres, estavam outra vez em boas situação, porém a causa de
seu progresso fica, como sempre, perdida em mistério.
Eles se hospedaram e logo atraíram
admiradores, ainda que ninguém tivesse certeza de onde se originavam, ou qual
era seu itinerário recente. Um laboratório foi montado num aposento para
estudos de Física e Química. A grande generosidade de Cagliostro levou um grupo
de impostores gananciosos a tentar trapaceá-lo através de processos legais que
exigiam dinheiro, acusando-o de praticar bruxaria. Esta última acusação foi
retirada imediatamente, mas uma coalizão de advogados e juízes desonestos
arrancaram-lhe cada centavo que puderam antes que o Conde ficasse livre de suas
intrigas. Suas intenções ficaram evidentes pelo fato de que, finalmente, todos
eles, de alguma forma, morreram na prisão ou foram executados por fraude,
perjúrio e outros crimes. Cagliostro recusou a oportunidade de propor recursos
reparatórios, mas decidiu deixar a Inglaterra.
Antes da partida, contudo, tanto
ele como a condessa foram admitidos na Loja Esperança da ordem da Estrita
Observância. Seu lema era “União, Silêncio, Virtude”, seu trabalho filantropia
e seu estudo, ocultismo. Através desta Ordem, Cagliostro espalharia a Maçonaria
Egípcia por toda a Europa. Deixando Londres em Novembro de 1777 com apenas
cinqüenta guinéus, viajou para Bruxelas “onde encontrei a Providência esperando
que enchesse meu bolso outra vez”. Esta é sempre a história de Cagliostro.
Quando ele aparece na história, ele tem tudo, não pede nada e deixa tudo
generosamente.
Veio para Hague, onde foi
recebido como um Franco-maçom pela loja local da Ordem da Estrita Observância.
Seu discurso sobre Maçonaria Egípcia, a mãe do puro impulso Maçônico, motivou a
Loja a adotar o Rito Egípcio tanto para homens como para mulheres. A Condessa
Cagliostro foi instalada como Grã-Mestra. Aqui emergiu a missão de Cagliostro
de purificar, restaurar e elevar a Maçonaria ao nível de verdadeiro ocultismo.
Esta tarefa comanda o centro das atenções pelo do resto de sua vida. Como suas
numerosas profecias sobre grandes e pequenos assuntos indicavam, ele tinha uma
visão clara da iminente arrancada da ordem social, política e religiosa da
Europa. Ele antevia que somente nas
Lojas unificadas os servidores dos homens sábios do Oriente poderiam, poderiam atuar junto tanto os nobres e os
homens comuns em mútua lealdade aos mais altos ideais e guiar a Europa através
da transição em direção a uma era iluminada.
Ao passar por Nuremberg, ele
trocou sinais secretos com um Franco-Maçom, hospedando-se no mesmo hotel.
Quando indagado quem era, Cagliostro
desenhou num papel a serpente mordendo sua cauda. O hóspede, imediatamente,
reconheceu um grande ser numa missão importante e, tirando um rico anel de
diamante de sua mão, investiu-o em Cagliostro. Quando ele chegou a Leipzig, a
Ordem estava preparada para homenageá-lo com um lauto banquete preparado para
um dignitário visitante, mas havia chegado a época de ser colocada a Maçonaria
Egípcia em sua verdadeira perspectiva. Após o jantar, Cagliostro fez um
discurso sobre o sistema e seu significado. Ele convocou os Maçons reunidos
para adotarem o Rito, porém a direção da Loja hesitou. Cagliostro avisou que o
momento da escolha para Maçonaria havia chegado e profetizou que a vida do
chefe – Herr Scieffort – estava na balança: se a Maçonaria Egípcia não fosse
abraçada, Scieffort não sobreviveria durante aquele mês. Scieffort recusou a
aceitar modificações em sua Loja, e cometeu suicídio poucos dias depois.
Abalados e intrigados, os membros da Loja aclamaram Cagliostro, e seu nome foi
ouvido pela cidade. Enquanto ele continuava a viagem, as Lojas da Ordem da
Estrita Observância calorosamente lhe davam boas vindas.
Seguiu para Mittau, capital de
Duchy de Courland e centro de estudos ocultos, ali chegando em março de 1791.
Cagliostro explicou o significado da Maçonaria Egípcia em termos de regeneração
moral da humanidade. Embora o homem tenha conhecido a natureza da deidade e o
mundo, os profetas, apóstolos e padres da Igreja apropriaram-se deste
conhecimento para seus próprios fins. A Maçonaria Egípcia continha as verdades
que poderiam restaurar este conhecimento numa humanidade renovada. O Marechal
Von Medem e sua família convidaram Cagliostro para ficar em Courland e
apresentaram-no às pessoas de influência. O longo interesse de Von Medem pela
alquimia logo se voltou para outros fenômenos, e ele pediu insistentemente a
Cagliostro que demonstrasse os poderes que, segundo boatos, ele possuía. A
princípio relutante, ele finalmente produziu uma quantidade de fenômenos, além
suas curas medicinais universalmente aclamadas.
Cagliostro agora deixou que
soubessem que ele era o Grande Cophta da Loja, um sucessor na linhagem de
Enoch, e que ele, obedientemente, recebia ordens de “seus chefes”.
Infelizmente, a vontade de apoiar a Maçonaria Egípcia alimentava-se da
insaciável fome por mais fenômenos. Cagliostro mostrou seus poderes em
numerosas ocasiões, mas recusava-se a ser empurrado para um mercado atacadista
de milagres. E pela primeira vez ele se viu chamado de impostor, quando não
atendia aos pedidos.
“O espiritismo nas mãos de um Adepto se torna magia”,
H.P.Blavatsky escreveu, “pois ele é
versado na arte de entremesclar as leis do Universo, sem quebrar nenhuma delas
e sem por isso violar a natureza”. Ela disse que homens tais como Mesmer e
Cagliostro “controlam os Espíritos, em vez de permitir que seus assuntos sejam
controlados por eles; e o Espiritismo está a salvo nas suas mãos”. Mas,
Cagliostro explicou, tais poderes eram para serem usados para o bem do mundo e
não para a gratificação da curiosidade ociosa.
Ele decidiu ir para São
Petersburg, onde foi aceito na Loja e inúmeras curas foram testemunhadas, mas
não receberam com calor a idéia da Maçonaria Egípcia. Recusando-se a produzir
os fenômenos, pensaram que era um curador, não um mago.
Varsóvia respondeu melhor,
contudo. Lá ele encontrou o Conde Moczinski e o Príncipe Adam Poninski, que
insistiu com Cagliostro para ficar em sua casa. Ele aceitou a Maçonaria Egípcia
e uma grande parte da sociedade polonesa o seguiu. Dentro de um mês, uma Loja
para o Rito Egípcio foi fundada. Em 1780 ele foi recebido em várias ocasiões
pelo Rei Stanislaw Augustus. Descreveu
o passado e predisse o futuro de uma senhora da Corte que duvidou de seus
poderes. Ela, imediatamente, atestou o passado, enquanto a história provou a
verdade no futuro.
Cagliostro deixou Varsóvia em 26 de junho e não foi visto até
19 de setembro, quando chegou a Strasburgo. Multidões aguardavam na Ponte de Keehl para ver sua carruagem e ele foi
aclamado quando entrou na cidade. Imediatamente, começou a atender aos pobres,
libertando devedores da prisão, curando os doentes e fornecendo remédios
gratuitamente. Tanto os amigos quanto os inimigos concordavam que Cagliostro se
recusava a receber qualquer remuneração ou benefício por seus incansáveis
trabalhos. Embora a nobreza se tornasse interessada, ele se recusava a produzir
fenômenos, salvo em seus próprios e estritos termos. Logo ficou íntimo do
Cardeal de Rohan, para quem ele previu a hora exata da morte da Imperatriz
Maria Theresa. O cardeal convidou-o a se hospedar em seu palácio e mais tarde
declarou que ele havia testemunhado em várias ocasiões Cagliostro produzir ouro
num vaso alquímico. “Posso dizer-lhe com certeza”, ele insistiu com uma senhora
que duvidava da habilidade de Cagliostro, “que ele nunca pediu ou recebeu
qualquer coisa de mim”.
O General Laborde escreveu que
nos três anos que Cagliostro viveu em Strasburgo ele atendeu quinze mil pessoas
doentes, das quais apenas três morreram. Sua reputação foi confirmada quando
ele salvou o Marquês de Lasalle, Comandante de Strasburgo, de um caso
desesperador de gangrena. Durante este período, o primo do Cardeal, Príncipe de
Soubise, adoeceu em Paris. Os médicos não lhe deram nenhuma esperança de cura e
o Cardeal, alarmado, suplicou a ajuda de Cagliostro. Este viajou incógnito a
Paris com o Cardeal, e o Príncipe recuperou a saúde em uma semana. Somente após
a cura foi sua identidade anunciada, para espanto da faculdade de medicina
parisiense.
Quando estava em Strasburgo, Cagliostro recebeu a visita de
Lavater, o fisiognomonista de Zurique, que indagou acerca da fonte do grande
conhecimento de Cagliostro. “In verbis, in herbis, in lapidibus”, ele
respondeu, sugerindo três grandes tratados de Paracelso.
Foi naquela época que Cagliostro foi tocado pela condição de pobreza de um homem chamado
Sacchi e empregou-o em seu hospital. No espaço de uma semana, Cagliostro
descobriu que o homem era um espião de alguns médicos invejosos e havia
extorquido dinheiro de seus pacientes a fim de torná-lo desacreditado. Posto
para fora do hospital, Sacchi ameaçou a
vida de Cagliostro e foi imediatamente expulso de Strasburgo pelo Marquês de
Lasalle. Sacchi inventou e publicou uma história difamatória na qual afirmava
que Cagliostro era um filho criminoso de um cocheiro napolitano. Esse absurdo
estava destinado a ser usado contra Cagliostro pelo resto de sua vida.
O Cardeal de Rohan, que havia
instalado um busto de Cagliostro talhado pelo escultor Houdon em seu estúdio em
Saverne, surgiu em sua defesa. Três cartas chegaram em março de 1783 da Corte
de Versalhes, para o Real Baylor de Strasburgo. A primeira, do Conde de
Vergennes, Ministro dos Negócios Estrangeiros, dizia: “O Sr. Di Cagliostro pede
apenas por paz e segurança. A hospitalidade lhe assegura ambas. Conhecendo as
inclinações naturais de V.S., estou convencido de que se apressará a cuidar
para que desfrute de todos os benefícios e amenidades que ele pessoalmente
merece”. A segunda veio do Marquês de Miromesnil, Guardador do Selo: “O Conde
di Cagliostro tem estado comprometido ativamente no auxílio dos pobres e
infelizes, e sou conhecedor de um fato notavelmente humanitário desempenhado
por esse estrangeiro, que merece lhe seja garantida proteção especial”. A
terceira, do Marechal de Segur, Ministro da Guerra, dizia: “O Rei encarrega
V.S. que cuide não somente de que ele não
seja atormentado em Strasburgo, como também que deva receber nessa cidade toda consideração
totalmente merecida pelos serviços
que tem prestado aos doentes e aos
pobres”.
Em junho chegou uma carta de
Nápoles, informando-lhe de que o Cavalheiro d'Aquino, seu companheiro em Malta,
estava seriamente doente. Apressou-se a ir
para Nápoles, apenas para encontrar o Cavalheiro morto. A Loja União
Perfeita saudou-o com homenagens e ali ficou por vários meses, já que o governo
napolitano tinha acabado de remover o banimento da Franco-Maçonaria. Bordeaux
convidou-o a ir para lá, e ele decidiu assim fazer, viajando em lentas etapas.
O Conde de Saint-Martin já havia
preparado terreno em Bordeaux e Lyons para instituir o Rito Retificado de
Saint-Martin, que havia purificado e enobrecido a idéia da Maçonaria. O Duque
de Crillon e Marechal de Mouchy pessoalmente lhe deram as boas vindas,
mostrando-lhe a cidade e homenageando-o em banquetes. Os pobres afluíam até ele
e eram curados. Em Bordeaux, Cagliostro teve um sonho no qual era levado a uma
brilhante câmara, na qual sacerdotes egípcios e nobres Maçons estavam sentados.
“Esta é a recompensa que você terá no futuro”, uma grande voz anunciou, “mas
por enquanto você deve trabalhar ainda com mais diligência” Havia chegado o
tempo de enraizar firmemente a Maçonaria Egípcia.
Alquier, Grão Mestre em Lyons,
chefiou um grupo de delegações solicitando que ele se estabelecesse ali
permanentemente. Aceito com toda a cerimônia dentro da Loja Lyons, foi
convidado a fundar uma Loja para a Maçonaria Egípcia. Uma captação feita entre
Maçons forneceu fundos para construírem um belo prédio, de acordo com as
instruções de Cagliostro. Logo teve início a construção da Loja da Sabedoria
Triunfante, a qual foi a Loja Mãe de todos os Maçons Egípcios, e a Cagliostro foi
dado completo gerenciamento da Loja de Alquier.
Cagliostro instruiu seus novos
discípulos a se retirarem em meditação por três horas diariamente, pois o
conhecimento é adquirido pelo
“preenchimento de nossos corações e mentes com a grandeza, a sabedoria e
o poder da divindade, aproximando-nos dela através de nosso fervor”. Cada um
deve cultivar a tolerância por todas as religiões, uma vez que existe a verdade
universal em seus âmagos; segredo, porque é o poder da meditação e a chave da
iniciação; e o respeito pela natureza, pois ela contém o mistério do divino.
Com estas três diretrizes como base, o discípulo poderia esperar pela
imortalidade espiritual e moral. A motivação que deverá estar sempre em mente é
“Qui agnoscit mortem, cognoscit artem” – aquele que tem conhecimento
sobre a morte, conhece a arte de dominá-la.
Tendo estabelecido a Maçonaria
Egípcia sobre as firmes fundações erigidas por Saint-Martin, Cagliostro não estava destinado a testemunhar seu
florescimento no grande templo para ela construído. O Cardeal de Rohan insistiu
com veemência que ele viesse a Paris. A Ordem dos Philaléthes tinha organizado
a Convenção Geral da Maçonaria Universal. Maçons proeminentes de todas as Lojas
da Europa tinham vindo para a primeira assembléia realizada em novembro de
1784. Mesmer e Saint-Martin foram convidados. Agora era a chance para a bênção
final do Rito Egípcio – “onde A Sabedoria triunfará” – fosse confirmada.
Cagliostro decidiu ir em janeiro de 1785. Deixando os negócios da Loja em
ordem, ele escolheu os oficiais permanentes e lembrou-lhes de seus
compromissos.
“Nós, os Grandes Cophtas,
fundadores e Grão Mestres da Suprema Maçonaria Egípcia em todas as quadrantes
orientais e ocidentais do globo, damos ciência a todos aqueles que verão o que
está aqui presente,que em nossa estada
em Lyons muitos membros deste Oriente que seguem o rito ordinário, e que
carregam o título de “Sabedoria”, tendo manifestado a nós seu ardente desejo de
se submeterem ao nosso governo e de receberem de nós a iluminação e os poderes
necessários para conhecerem e propagarem a Maçonaria em sua verdadeira forma e
pureza original, atendemos aos seus pedidos, persuadidos de que, aos lhes
fornecermos sinais de nossa boa vontade,
conheceremos a grata satisfação de termos trabalhado para a glória do
Eterno e para o bem da humanidade.”
“Em aditamento, instruímos cada
um dos irmãos que andem constantemente no estreito caminho da virtude e que
mostre, pela propriedade desta conduta, que
conhecem e amam os preceitos e o propósito de nossa Ordem.”
Quando Cagliostro chegou a Paris,
tentou viver uma vida retirada, de modo a trabalhar pela união das Ordens
Maçônicas. Mas os doentes irromperam em sua casa e ele outra vez passou longas
horas curando-os. Panfletos surgiram por toda Europa com um retrato do divino
Cagliostro, desenhado por Bartolozzi, sob o qual se escreveram as seguintes
palavras:
“Reconheçam as marcas do amigo da
humanidade. Cada dia é marcado por novo benefício. Ele prolonga a vida e
socorre o indigente, o prazer de ser útil é sua única recompensa.”
Cagliostro veio para auxiliar o
progresso da Maçonaria Egípcia. Rapidamente fundou duas Lojas. Savalette de
Langes convidou-o a se unir à Philaléthes, junto com Saint-Martin. Este último
recusou, com base em que a Ordem seguia práticas espíritas, porém Cagliostro
aceitou provisoriamente, e declarou sua missão:
“O desconhecido Grão Mestre da
verdadeira Maçonaria lançou seus olhos sobre os Philalétheanos... Tocado pelo
sincero reconhecimento de seus desejos,
ele se digna estender sua mão sobre eles, e consente em conceder-lhes um
raio de luz dentro da escuridão de seu templo. É o desejo do Desconhecido Grão
Mestre provar a eles a existência de um Deus – a base de sua fé; a dignidade
original do homem, seus poderes e destino... É por atos e fatos, pelo
testemunho dos sentidos, que eles conhecerão DEUS, O HOMEM e as coisas
espirituais intermediárias (princípios) existentes entre eles: dos quais a
verdadeira Maçonaria dá os símbolos e
indica o verdadeiro caminho. Que eles, os Philaléthes abracem as doutrinas
desta verdadeira Maçonaria, submetam-se às normas de seu chefes, e adotem sua
constituição. Mas, acima de tudo, que o Santuário seja purificado; saibam os
Philaléthes que a luz pode apenas descer dentro do Templo da Fé (baseada no
conhecimento), não dentro daquele do Ceticismo. Que se dediquem às chamas as
vaidades acumuladas em seus arquivos; pois é apenas sobre as ruínas da Torre da
Confusão que o Templo da Verdade pode ser erigido.”
Após infrutíferas
negociações, ele enviou a seguinte mensagem:
“Saibam que não estamos
trabalhando para um homem, porém para toda a humanidade. Saibam que desejamos
destruir o erro – não somente um simples erro, porém todos os erros. Saibam que
esta política é dirigida não contra exemplos isolados de perfídia, porém contra
todo um arsenal de mentiras.”
Finalmente, após ter ficado claro
que a grande Convenção não chegaria a nenhum acordo, ele enviou a última e
triste carta: “Já que vocês não têm fé nas promessas do Deus Eterno ou de Seu
ministro na terra, eu os abandono a vocês mesmos, e lhes digo esta verdade: não
é mais minha missão ensinar-lhes. Infelizes Philaléthes, vocês semearam em vão;
vocês colherão apenas ervas daninhas”. Assim, foi perdida a maior possibilidade
de lançar as fundações da Fraternidade Universal à época de Cagliostro.
O restante da vida de Cagliostro
é trágico. O cardeal de Rohan desejou obter um lugar na corte, porém Maria
Antonieta não gostava dele. Madame de Lamotte, desconhecida da Rainha, viu uma
chance para um grande ganho pessoal na frustração do Cardeal. Fazendo-se de
confidente da Rainha, ela forjou cartas de Maria Antonieta para de Rohan e
fingiu que levava respostas de volta a Versalhes. Finalmente ela induziu o Cardeal a comprar um ostentoso colar no
valor de um milhão e seiscentos mil livres
para a Rainha, colocando o valor em sua conta. Quando a primeira prestação venceu, a Rainha, que não sabia nada
do negócio, não pagou e de Rohan foi forçado a honrá-lo. A batalha que se
seguiu na Corte viu Madame de Lamotte defendendo-se e acusando a Rainha de
trapaça e Cagliostro de roubar o colar que ela mesma havia quebrado e vendido.
A Rainha ficou furiosa, e todas as partes envolvidas no caso foram encarceradas
na Bastilha. Embora Cagliostro fosse completamente inocente, tanto ele como
Seraphina passaram seis meses na prisão. O caso alcançou tão horríveis
proporções que a velha e abusiva denúncia de Sacchi veio a público e lida
contra Cagliostro, mas o Parlamento de Paris ordenou sua supressão por ser
“injuriosa e caluniadora”. Finalmente Cagliostro foi declarado inocente e
libertado diante de dez mil parisienses que esperavam por ele. O “Caso do Colar
de Diamantes” é em geral admitido como sendo o prólogo da Revolução [francesa]. Maria
Antonieta considerou a libertação de Cagliostro e do Cardeal como um ataque à
sua reputação. O Rei ordenou que Cagliostro deixasse a França e afastou o
Cardeal de suas atribuições.
Cagliostro viajou para a
Inglaterra, porém seus inimigos, agora completamente cientes da total natureza
de sua missão, viram a chance de destruí-lo. Mal havia chegado à Inglaterra
quando o famoso editor do vicioso Correio da Europa o atacou. Cagliostro alojou
Seraphina com o artista de Loutherbourg e viajou para a Suíça em 1787.
Seraphina juntou-se a ele na
companhia de Loutherbourg imediatamente depois. A Maçonaria Egípcia era
praticada por pequenos grupos em Bale e Bienne, mas não puderam apoiar o casal
Cagliostro. Já que seus próprios poderes somente poderiam ser usados para os
outros e não para si mesmo, e agora que os outros o rechaçavam, ele era forçado
a viajar sem repouso.
Por volta de 1789 ele chegou a
Roma para encontrar-se em segredo com Franco-Maçons da Loja Verdadeiros Amigos.
A Igreja, porém, totalmente ciente da ameaça espiritual que Cagliostro
apresentava para ela, enviou dois Jesuítas fazendo-se de convertidos para a
Maçonaria Egípcia. Na ocasião em que eram admitidos à Ordem, eles convocaram a
policia papal, e o casal os Cagliostro foi levado para a prisão no Castelo
Santo Ângelo em 17 de dezembro. Se Seraphina se voltou contra Cagliostro ou
sucumbiu por medo diante da Inquisição, não está claro. Mas seus depoimentos
foram prejudiciais. Após dúzias de interrogatórios, nos quais a trama foi
ameaçadoramente disposta, a Inquisição soube apenas o que todo mundo sabia: que
Cagliostro era um Maçom, um herege pela
sua crença de que todas as religiões são iguais, e que desprezava a
intolerância religiosa. A farsa terminou em 21 de março de 1791, quando a
Inquisição condenou Cagliostro à morte. Entretanto, antes de o Papa assinar a
sentença, um estrangeiro apareceu no Vaticano.
Dando uma palavra ao Secretário do Cardeal, foi imediatamente admitido
em audiência. Após sua saída, o Papa
comutou a sentença para prisão perpétua.
Seraphina foi libertada apenas
para ser presa por novas acusações e internada no convento de Santa Apolônia de
Trastevere. Nada mais se soube sobre ela e seu corpo nunca foi encontrado.
Cagliostro foi enviado ao Castelo São Leo e colocado no topo inacessível de um
rochedo. Lá ele pereceu até 1795. Uma inscrição que fez na parede de sua cela
tem a data de 15 de março. Roma reportou que ele morreu em 26 de agosto.
Aqui acaba a
história, mas a tradição maçônica sussurra que Cagliostro escapou da morte.
Endreinek Agardi de Koloswar relatou que o Conde d’Ourches, que quando criança havia conhecido Cagliostro,
jurou que o Senhor e a Senhora de Lasa, saudados em Paris em 1861, não eram
ninguém menos que o Conde e a Condessa Cagliostro. Com o nascimento envolto em
mistério, Cagliostro saiu desta vida também em mistério, conquanto sua
existência tenha sido dedicada ao serviço da humanidade e à esperança da
imortalidade espiritual.