As Forças
Naturais na Alquimia
Palestra
Pública proferida na Loja Liberdade em 28 de agosto de 1998
por Carlos Eduardo G. Barbosa e Fernando José
Gramaccini.
Nosso assunto é Alquimia e forças naturais.
É claro que quando nós falamos de alquimia, nós temos
um estereótipo de alquimia, de alquimista ou é o
sujeito transformando chumbo em ouro, ou é o indivíduo
paramentado, com aquele chapéu de bruxo ou de mago
fazendo suas operações num laboratório misterioso, com
fórmulas estranhas.
Vamos falar de Alquimia de uma outra forma. Vamos
falar de alquimia pelos princípios próprios da
alquimia, que são os princípios de manipulação das
forças naturais para a obtenção de determinados
resultados ou efeitos que estarão sempre manifestos,
como é de se esperar, no mundo material.
Está certo que muita gente fala da alquimia
simbólica, da alquimia filosófica. Mas o alquimista
sempre deixou muito claro que, ainda que os mecanismos de
seus procedimentos pudessem ser entendidos de um ponto de
vista simbólico, metafísico, filosófico, nada estaria
resultando correto se não houvesse transformações de
fato na esfera dos fenômenos materiais. Porque a
matéria é, por assim dizer, o papel no qual as forças
naturais escrevem os resultados das ações que elas
executam.
Então, se estamos mobilizando forças naturais com
finalidades diferentes daquelas usuais, é claro que
essas forças vão desenhar um resultado diferente no
universo material.
Nós não vamos passar para vocês a fórmula para
transformar chumbo em ouro, pois não é esse o nosso
objetivo. Então quem estiver com esse objetivo pode
"tirar seu cavalinho da chuva".
É evidente que nós temos que passar por algumas
etapas no entendimento desta questão das forças
naturais. Primeiro, a eterna pergunta, já que estamos
falando de forças: "O que são forças?". Há
um conceito científico de forças que de baseia no
conceito anterior de energia. Se temos uma força, ela é
a manifestação prática de uma energia que está
realizando um trabalho, que evidentemente aparece na
matéria. Energia e matéria são os dois extremos de uma
visão moderna da Ciência sobre a substância que forma
o Universo. Num extremo a matéria formal, tal como nós
a conhecemos, e no outro extremo a energia pura, na sua
forma latente ou potencial.
Quando a matéria manifesta a energia, percebemos essa
energia na forma de movimento. Esse movimento representa
a presença das forças na matéria. Vejam que nós temos
dois elementos relativamente estáticos energia,
num extremo, que é um conceito abstrato, uma
potencialidade, uma capacidade de um determinado objeto
produzir um determinado trabalho; e num outro extremo, o
segundo componente, que é o objeto em si, e que também
é estático porque é uma massa passiva, é a matéria
geometrizada, espacializada, eventualmente temporalizada,
mas que é passiva. Ela está inerte. A matéria está
aguardando a ação que a energia tem a latência de
produzir.
Mas nós temos os movimentos neste terceiro elemento,
que é a força. Isso nos traz à memória a tradicional
trilogia Espírito, Vida e Matéria. A gente pode fazer
esta aproximação e entender que o espírito estaria
associado à idéia da energia, a matéria seria
justamente o objeto materializado, e a vida seria a
manifestação das forças modificando essa matéria, ou
seja, consumindo ou transformando energia em movimento ou
alterações na estruturas dos objetos aqui em baixo.
Nós estamos achatando todo um universo ao qual
costumeiramente damos uma profundidade espiritual,
reduzindo-o à esfera apenas dos fenômenos materiais.
Essa energia é material, esse objeto é material e essa
força é manifestada na matéria. Falamos, por exemplo
de uma porta que se move. Ela tem uma energia, há
forças que estão movendo ela, ele tem posições que
estão sendo alteradas, etc. Tudo isso é, evidentemente,
um fenômeno material.
Falamos de fenômenos materiais mas que, por
aproximação nos revelam uma semelhança com a estrutura
espiritual que nós imaginamos para o universo. Objeto,
força, como representação da vida, e energia como
representação da presença espiritual.
Quando imaginamos que as forças atuam sobre os
objetos, que elas tiram alguma coisa da energia e jogam
sobre o objeto, e eventualmente tiram alguma coisa da
estrutura do objeto e transformam em energia, nós
estamos imaginando um movimento. A maior parte dos
estudantes imaginam esse movimento como sendo meio
aleatório, casual, abstrato, do ponto de vista da ordem.
Ele é um pouco caótico. Como essa força aparece? De
repente a energia virou força... De repente o objeto
está se movimentando. Eu largo um torrão de açúcar
dentro da água e ele começa a se desmanchar.
Eu estou esquecendo que por trás de cada força
existe alguma ordem. É claro que a Ciência, quando
estudou essas forças, mesmo do ponto de vista
exclusivamente material, percebeu que existe uma ordem e
estabeleceu que as forças obedeciam a determinadas leis.
A lei é um conceito abstrato que representa essa
tendência dos movimentos seguirem uma determinada ordem.
Nós observamos o funcionamento da matéria, e vemos, por
exemplo, que toda água escorre para baixo. Procuramos
identificar aí uma lei, que, por assim dizer, condiciona
o movimento da água sempre para baixo. E vamos descobrir
uma hora ou outra uma lei que chamamos de lei da
gravidade, que puxa sempre os objetos em direção ao
centro da Terra.
Nós fazemos um trabalho inverso no caso dos
relacionamentos sociais da Humanidade. Nós não
observamos o comportamento das pessoas e daí tiramos as
leis. Nós criamos leis para orientar o comportamento das
pessoas. Qual é a diferença? A diferença é que aqui
nós não sabemos como comandar o comportamento da
matéria. Então nós procuramos entender as leis que já
existem e que comandam a matéria. No caso dos seres
humanos nós temos a capacidade de comandar, e então
nós criamos leis que comandam os seres humanos.
Qual é a diferença entre as forças sociais e as
forças materiais que estão movendo o nosso mundo? Para
nós a diferença parece clara. As forças sociais são
controláveis e as forças materiais não são. As
forças materiais têm uma natureza própria e
independente da nossa vontade. Mas as forças sociais
podem ser alteradas pela nossa vontade. Essa é a nossa
concepção. Uma concepção ocidental, moderna,
científica. Quando falamos em fazer política, estamos
falando em interferir nas forças sociais. O político
pode ser mentiroso, mas faz um discurso bonito e muda as
forças sociais, de uma forma construtiva ou destrutiva.
Mas e o físico? O Fernando chega em seu laboratório e
faz um discurso bonito e a matéria se transforma? O
ferro se transforma em ouro, seria ótimo, não? No
entanto o discurso do Fernando jamais vai convencer os
átomos de ferro a se converter em ouro. Nós temos
motivos para entender que essas forças são diferentes.
Mas essa é a nossa visão, a visão ocidental.
Se nós queremos estudar Alquimia, vamos ter de mudar
essa nossa visão. Vamos ter de entender que a força,
qualquer que seja ela, é sempre o resultado da ação de
uma vontade. Essa vontade estabelece, de fato, uma ordem.
Ela estabelece leis, as leis naturais. A matéria é
totalmente obediente às leis naturais. No entanto essas
leis naturais não brotam espontaneamente da matéria,
pois são produzidas por uma vontade superior,
espiritual, que cria as forças.
O alquimista acredita que essa vontade espiritual pode
ser alcançada por um ser humano, que dessa maneira
poderia interferir nesse procedimento de criação e
ordenação das forças materiais. Em razão dessa sua
crença foram ridicularizados. Eles foram excluídos da
aceitação do mundo, tanto do religioso quanto do
científico. Eles ficaram na mesma situação dos
primeiros teosofistas que eram execrados tanto pelos
cientistas quanto pelos religiosos. Os alquimistas
propunham idéias que não eram bem aceitas.
Como lidar com forças naturais, provocar alterações
no mundo natural, pode ser uma coisa muito perigosa, ...
se nós imaginarmos uma pessoa que em lugar de estar
mobilizada por uma vontade espiritual, está mobilizada
por uma vontade muito mesquinha, e que decide, pela sua
vontade, mudar algumas leis, mudar o funcionamento de
certas forças, e, consequentemente prejudicar outras
pessoas, nós estamos pensando numa catástrofe social.
Os alquimistas que realmente alcançavam produzir esse
fenômeno, essa interferência sobre as forças naturais,
ocultavam esse conhecimento dificultavam o acesso
a esse conhecimento criptografando as suas escrituras ou
grafando simbolicamente os conceitos de uma forma que
tornasse eles inofensivos nas mãos de um não-iniciado.
Se nós acreditamos que eles realmente acharam uma chave,
um caminho para lidar com essas forças e produzir
efeitos sobre os objetos do mundo material (mobilizando
energia do mundo para transformar os objetos de acordo
com sua vontade) é evidente que tudo que nos chega do
trabalho desses alquimistas está tão intrincadamente
representado na forma de símbolos ininteligíveis e
complicados que nós acreditamos que se eles realmente
fizeram isso, fizeram e esconderam muito bem. Aprenderam,
ousaram e calaram, definitivamente.
Mas, para acreditar nisso, precisamos aceitar que é
possível essa interferência sobre a matéria. Embora a
nossa ciência, a ciência dos físicos, dos químicos,
não aceite essa possibilidade apresentada pelos
alquimistas, outros tipos de ciências, também modernas
começaram a perceber que a coisa não é bem assim. Há
de fato uma relação plausível entre fenômenos
conhecidos, cientificamente estudados, e o simbolismo dos
alquimistas. A primeira ciência que começou a perceber
isso foi a psicologia. Um dos pais da psicanálise, Carl
Gustav Jung, que era discípulo de Freud e se tornou
dissidente, desenvolveu uma maneira própria de pensar, e
que estudava muito as culturas do oriente, mergulhou no
estudo da alquimia e descobriu que a alquimia, através
de suas representações simbólicas, demonstrava muito
bem o funcionamento do psiquismo humano. Todos os
processos mentais que os psicólogos estudam são
perfeitamente delineados nessa obra do alquimista. Estão
aí representados com muita precisão.
Com isso se criou um novo tipo de estudos desses
procedimentos enunciados pelos alquimistas, onde não
interessava o que acontecia entre os átomos, o que
acontecia na matéria, mas sim no que poderia ser
aprendido, a partir desses símbolos, sobre as leis que
regem o funcionamento da mente humana. Estamos já
falando de outras forças, que não são as forças
sociais, nem as forças materiais, mas sim as forças
individuais da mente do homem.
Fernando Gramaccini Eu queria fazer um
parêntese bastante rápido da física, para mostrar
algumas incoerências que existem. Você vai entrar num
outro assunto, e eu acho bastante interessante fazer uma
colocação antes.
Quando perguntaram para Isaac Newton da natureza da
força, por que os planetas giravam ao redor do Sol, etc.
ele falou de uma forma muito folclórica que existiam
anjos que regiam as forças da natureza. E ele entrou
para o folclore da física, apesar de ele ter feito
fórmulas, como por exemplo aquela famosa "Força =
massa x aceleração ao quadrado", etc., fórmulas
que são vistas e medidas, razão pela qual ele é muito
respeitado. Só que eu queria mostrar alguns fatos,
rapidamente.
Se você pegar um átomo de hidrogênio, você tem um
núcleo positivo com um elétron negativo rodando ao
redor do núcleo. A proporção dos tamanhos seria a
mesma coisa que, no Maracanã, se você tivesse no centro
do estádio de futebol uma bola de futebol, e na parte
mais extensa do estádio, aquela parede que separa o
Maracanã da rua, você teria uma bolinha de gude. Quer
dizer que o átomo é completamente vazio. Se a gente
pegar todos os átomos presentes no edifício Empire
State Building e retirar os espaços entre a matéria ele
se reduz a uma cabeça de alfinete. A matéria é vazia,
e o que mantém essa solidez é a energia que interage
entre as partículas.
Isso é o hidrogênio. Só que quando eu vou para o
Urânio, eu tenho, no mesmo núcleo, 93 prótons juntos e
aí o que mostra a própria ciência é que cargas iguais
de mesmo sinal se repelem. Se eu puser um próton aqui e
um outro próximo a ele, eles não ficam juntos. Um vai
para cá e o outro vai para lá. Como se explica, então,
93 prótons juntos dentro de um átomo de Urânio? Então
o que se fala é que na hora que eles são formados no
interior da estrela, na hora em que as estrelas estão
explodindo nas supernovas, a matéria está tão
condensada que ela libera a energia, a própria matéria,
e uma força, chamada nuclear, mantém os 93 prótons
juntos, mais 93 nêutrons, de carga nula. Aí entra a
física nuclear ao interferir nesses átomos aqui,
dissociando essas matérias que têm a mesma carga, e ao
dissociar elas liberam uma energia que as manteve juntas,
como uma mola que eu fico segurando. Quando eu faço uma
reação de fissão nuclear, eu libero essa mola.
O que acontecia com os alquimistas foi por isso
que eu quis fazer esse parêntese agora quando
eles usavam a vontade, ... (na realidade essas
explicações são colocadas como se fossem dogmas. A
física não explica muita coisa. Ela é uma ciência de
efeitos, e não de causas. Você vai entrar na causa, a
física não explica muita coisa.) ... então quando eles
usavam a vontade para interferir na transformação da
matéria, eles estavam, por processos completamente
desconhecidos, liberando essas forças da natureza. Eles
poderiam liberar essas forças da natureza, transmutar
para si mesmo, amplificar seu poder do pensamento,
conseguir forças fantásticas. Se, e somente se fossem
pessoas de uma ética incomum.
Eu só queria mostrar isso. Você já está entrando
numa parte da psicologia, que é muito interessante, mas
a física não explica muita coisa não. Ela dá
explicações plausíveis, possíveis e aceitáveis, mas
são explicações que estão aí por falta de outra
melhor. Esse é o problema. Quando a gente entra nesse
campo é diferente. Mexer com a natureza da matéria é
libertar energias monstruosas. Basta ver uma bomba de
hidrogênio. Esse é um problema do qual o pessoal da
física e da química fala muito, mas não prova nada.
Fica como postulado.
Carlos Eduardo O Fernando falou sobre Isaac
Newton explicando que os anjos estão por trás dos
movimentos da matéria. E ele não estava sozinho. Outros
pesquisadores seguiam por essa mesma linha.
Um dos pontos essenciais da ciência da alquimia era
justamente a crença que o alquimista tinha, sua firme
convicção de que por trás de cada fenômeno material
existia um tipo de inteligência que nós vamos chamar
aqui de "inteligência material" que estava
regendo esses fenômenos.
Esse princípio da inteligência material foi
estudado, no século passado, pelo presidente da Seção
Química da Real Academia de Ciências de Londres, Sir
William Crookes. Crookes estudou as reações químicas e
o comportamento dos átomos em várias situações, e
chegou a uma conclusão. Os átomos se comportavam
diferente em situações diferentes. E se eles eram todos
iguais, eles deveriam ter um comportamento igual em todas
as situações. Mas eles tinham comportamentos
diferenciados sob certas circunstâncias, como se, em uma
reação química em que um dos reagentes estivesse em
excesso em relação ao outro (ou seja alguns átomos
vão reagir e outros não vão), parecia como se alguém
estivesse escolhendo qual vai e qual fica. Haveria um
tempo maior de reação porque alguém, ou alguma
inteligência essa foi a conclusão dele
estava selecionando qual quais os átomos que iriam e
quais os que não iriam participar da reação. Se
houvesse um processo de seleção isso implicava em haver
diferenças entre os átomos de um mesmo tipo, o que era
impensável para a ciência da época. Mas por trás
dessa questão, existia um outro conceito mais
importante, que era o que interessava a William Crookes,
que era o conceito da inteligência material.
Ele avançou nesse conceito quando foi estudar, por
exemplo, as materializações espíritas. Ele achava que
era uma manifestação da inteligência material que
produzia aquilo. Mesmo se eu não acredito no espírito,
eu posso acreditar que a matéria pode ter um
comportamento curioso, imitando o comportamento humano,
mas sem ser propriamente um ser humano. Ele foi a fundo
nessa pesquisa, o que acabou resultando na sua expulsão
da Academia e do meio científico. Ele se tornou um
maldito.
Vários desses malditos constituem a história da
pesquisa da ciência. Até hoje alguns malditos são
expulsos, vez por outra, das academias, mas isso não
impede que a inquietação provocada por esses
questionamentos persista entre as pessoas.
Se estamos falando de inteligência material, nós
estamos falando de uma espécie de alma, no conceito
antigo, que está por trás da matéria. Os antigos
falavam em "alma do mundo" (anima mundi),
um conceito que Pierre Teillard de Chardin, tentando
adaptar à filosofia cristã, chama de "meio
divino" o corpo do Cristo, a biosfera,
envolvendo conceitos da ecologia.
Atendo-nos apenas à idéia de que existe
inteligência por trás dos movimentos da matéria, ou
seja, das forças materiais, precisamos tentar entender o
mecanismo dessa inteligência. A força material é
representada pelos alquimistas por uma figura simbólica
chamada mercúrio.
Vou apresentar algumas figuras para ilustrar o
assunto. São ilustrações de um período que vai do
século XVI ao século XVIII, encontradas em textos de
alquimistas.
Isto aqui é a fonte mercurial. Uma espécie de fonte
em que está jorrando o mercúrio filosófico do
alquimista. O mercúrio representava justamente as
forças materiais. Era a representação da vida na
matéria. Tanto que alguns até hoje chamam o metal
mercúrio de "prata viva", porque ele é
líquido à temperatura ambiente e tem um comportamento
curioso. O mercúrio está associado à idéia de
líquido. [e à palavra e à sabedoria, fluindo como um
rio] e as representações do mercúrio sempre traziam
duas figurinhas que o estavam sempre acompanhando. Vocês
vêm aqui o Sol e a Lua, a consciência e a
inconsciência, do ponto de vista da psicanálise. O Sol
e a Lua, representando o ouro e a prata, e as naturezas
opostas do dois equilibradas pela figura do mercúrio
filosófico.
O Sol e a Lua estão representando, na verdade duas
fontes de inteligência (nós estamos chamando de
inteligência a origem das forças) que estão associadas
a uma série de fenômenos naturais claramente
identificáveis.
A Lua está associada a forças ligadas à noite, pois
é o astro que brilha à noite, enquanto o Sol é o astro
que está associado à luz do dia. A Lua também
normalmente se associa a forças destrutivas, enquanto
que o Sol está associado ao surgimento da vida, à
construção da vida, logo às forças construtivas. A
Lua está associada aos fenômenos líquidos, às águas.
A maré é um exemplo claro disso, pois sobe buscando a
Lua. Já o Sol está associado aos fenômenos ligados ao
fogo celeste, o brilho, o calor. Quando a Lua não se
associa à água, ela acaba sendo relacionada à terra. A
terra mãe, terra nutriz, a terra como origem da vida
material. Enquanto que o Sol, além do fogo, é
normalmente associado ao ar.
Nós fomos utilizar os quatro elementos básicos que
eram elencados no passado associados às atividades dos
alquimistas. Então percebemos que eles têm, por assim
dizer, dois domínios diferentes bem marcados. Podemos
elencar uma série de outros elementos simbólicos
relacionados a um ou ao outro. Mas são elementos que
indicam forças que se alternam na natureza para produzir
o fenômeno da vida que é representado por mercúrio.
A figura do mercúrio é uma figura híbrida.
Ela sempre tem, associadas a ela, duas forças
opostas. O mercúrio às vezes é mostrado como um
indivíduo hermafrodita, ou às vezes como um indivíduo
que é metade preto e metade branco, ou então como uma
figura com duas cabeças. Em outros momentos nesta
figura, por exemplo ele segura dois caduceus e de
cada lado ele tem um indivíduo segurando um bastão
(símbolo de força) e em cada bastão desses há um
animal: neste indivíduo é a cobra que é o Sol,
aqui junto dele; e no caso deste outro indivíduo é o
pássaro que é a Lua, também junto dele. Essa
figura do mercúrio mostra para nós que ele tem uma
natureza dual. É diferente do Sol e da Lua, que são
claramente diferenciados.
O mercúrio representa, através desse símbolo, a
integração do Sol e da Lua. A integração dessas duas
naturezas ou fontes de forças naturais de uma forma
equilibrada, que se traduz em vida.
Essas duas forças, sem a presença equilibradora do
mercúrio, se manifestam sempre de uma forma excludente.
Existe uma figura aqui, chamada de "O Lobo e o
Rei". É uma figura separada em duas
partes. Na parte de baixo, o lobo matou o rei e está
devorando seu corpo. Na parte de cima, o rei matou o lobo
e está queimando ele numa fogueira. O lobo está
associado à Lua, ele uiva para a Lua, ele é a natureza
lunar. O rei é o Sol, o astro soberano, que está
associado ao fogo, à morte pelo fogo. Enquanto que o
lobo se relaciona ao sangue, à morte molhada,
ensangüentada, do corpo que ele está devorando. Quando
os dois estão isolados, são excludentes. Para um estar
vivo, o outro precisa estar morto. Para um estar
presente, o outro tem de estar ausente.
O mercúrio também se associa a uma figura bem
conhecida dos teosofistas, o "ouroboros".
Ele é o ciclo ou a figura circular, geralmente uma
serpente ou dragão mordendo a própria cauda. Vocês
vêm que aqui nós apresentamos duas figuras
alternativas. A de baixo mostra dois dragões, um
mordendo a cauda do outro, formando esse círculo. É
igual o que os coreanos usam muito, aquela figura do Tao,
da filosofia chinesa, em que duas forças opostas, Yin e
Yang, são representadas na forma de forças circulares.
Esta aqui nós conhecemos bem porque está no símbolo da
Sociedade Teosófica, aquela serpente que morde a
própria cauda. Isto é um símbolo da atividade do
mercúrio. É a integração das forças formando um
círculo da eternidade, o ciclo da vida, da criação, da
produção. É a destruição de um lado e a criação do
outro; a morte de um e o alimento para o outro. E mostra
que isso tudo é um fenômeno que atinge uma única e
mesma natureza integrada, global e genérica.
Essa integração provocada pelo mercúrio os indianos
representavam na forma das figuras geométricas centradas
em um ponto. Os Yantras ou os mandalas, que eram várias
alternativas que existiam para isso.
Este aqui é o Yantra de Shri, uma deusa mãe. Essas
figuras representavam de uma forma menos ilustrativa, e
mais geométrica, esse princípio do centro, do
equilíbrio, de forças ou figuras opostas. No caso ali
são triângulos opostos, um para cima e outro para
baixo, mas integrados de tal maneira que se perde a
noção clara de qual está para cima e qual está para
baixo, porque se entremesclam de tal maneira que fica
difícil saber para que lado eles estão apontando.
A integração que se mostra nessas figuras é
tipicamente mercurial, do ponto de vista filosófico.
Isso tudo para nós pode parecer uma bobagem
simbólica. Pode parecer que é pura teoria, mas a nossa
vida esta toda baseada nesses princípios que estamos
elencando aqui. Nós vamos falar, por causa do limite de
tempo da palestra, de uma forma abreviada e resumida
sobre essa questão. Mas vamos perceber que quando o
alquimista fala das forças naturais que está
movimentando, ele fala de forças do universo material ao
nosso redor, mas que também estão dentro de nós. E
como em todo processo iniciático, elas precisam ser
controladas ou orientadas dentro de um determinado
"vaso" ou recipiente, que pode ser tanto um
vaso material (um vaso de vidro), quanto pode ser o nosso
linga sharira (nossa aura ou corpo de forças)
representando a garrafinha dentro da qual nós estamos
sendo cozidos por esse fogo do alquimista. Nós somos a
matéria primordial, como um punhado de terra pode ser a
matéria primordial para outro indivíduo.
Quando o alquimista está falando do Sol e da Lua,
nós podemos assimilar essa figura a duas fontes de
inteligência que existem também dentro da nossa vida,
orientando também o nosso comportamento. Associados ao
Sol temos determinados aspectos de nossa mente,
começando pela consciência. É a luz da razão,
constituindo a nossa vida mental, a nossa vida
intelectual.
A Lua estará associada aos sonhos, à inspiração do
poeta, coisas que não são parte do que chamaríamos de
nossa vida intelectual. Algumas pessoas gostam de
associar a Lua à nossa vida emocional. Mas nós vamos
seguir um outro padrão para entender isto melhor e vamos
associar logo a Lua ao nosso corpo. É no corpo que a Lua
aparece mais claramente. Quem não sabe o quanto a Lua
interfere nos fluxos dos líquidos do nosso corpo. Toda
mulher sabe disso porque passa pelo ciclo da
menstruação. Todo homem sabe disso, especialmente
quando o cabelo começa a cair e vemos buscar as
tabelinhas lunares para cortar o cabelo na lua certa.
Todo mundo, de um jeito ou de outro percebe uma
interferência da Lua diretamente nos fenômenos ligados
ao funcionamento do seu próprio corpo, ao funcionamento
de suas glândulas, do seu aparelho circulatório, a
própria circulação. Tudo em nosso organismo parece
estar misteriosamente ligado às atividades da Lua.
Os antigos também associavam o corpo à natureza da
Lua. Mas se eu estou associando o corpo à Lua, as
emoções não estão ligadas ao corpo? Vamos dar um voto
de crédito aos antigos e vamos imaginar que as emoções
também estejam associadas ao Sol. Os indianos dizem o
seguinte: as emoções aparentemente mexem com nosso
corpo (ragas), mexem com nossos desejos e com nossa
natureza corporal, mas sempre passando por uma
percepção consciente de alguma coisa que acontece ao
nosso redor. As emoções brotam a partir de estímulos
da nossa consciência. Ela pode ser modificada por
fatores inconscientes, como a própria atividade
intelectual também pode, mas a sua origem está naqueles
elementos que brotam a partir da nossa experiência
consciente.
A cor das emoções é o vermelho. Claro, quando eu
fico emocionado, às vezes eu fico ruborizado. Mas o
vermelho é uma cor naturalmente relacionada ao calor e
à natureza solar. O intelecto se diz que é amarelo.
Alguns clarividentes dizem que o intelectual tem a aura
amarelada. Então vamos imaginar que as emoções, assim
como nossa vida intelectual, estão ligadas à nossa vida
consciente. Pois a emoção, como a própria palavra diz,
é originada por fatos externos à nossa vida e aos
limites do nosso corpo. Ela não tem origem interna. Não
tem origem diretamente ligada a nós. Está associada a
um fato externo que nos mobiliza internamente.
Para dizer isso de uma outra forma, tanto as idéias
que constituem a nossa intelectualidade quanto as nossas
emoções estão associadas a objetos externos, ou
fatores externos daí a necessidade dos processos
da consciência para que sejam integrados à nossa vida
interna e à nossa identidade pessoal. O Sol nasce para
todos, ilumina a todos, revela a natureza de todos para
todos. Tudo isso tem um caráter bastante coletivo. A
consciência é coletiva. Embora se costume dizer que
apenas o inconsciente é coletivo, na verdade percebemos
que a consciência é coletiva.
Por outro lado, tudo o que diz respeito ao corpo
traduz aspectos da nossa identidade pessoal.
Se nós entendermos bem essa chave de separação das
naturezas vamos entender o mecanismo dessas forças
utilizadas pelo alquimista.
O corpo revela a nossa identidade. Vejam bem, o fato
de eu ter nascido no Brasil, de eu torcer para um
determinado time de futebol, de eu participar de um
partido político, ter uma formação numa faculdade,
isso tudo não me torna um indivíduo diferente dos
demais. Isso me torna igual aos outros. Se eu nasci no
Brasil, como tantos outros, eu sou brasileiro como eles.
Se eu torço para um time de futebol, como tantos outros,
eu sou um torcedor igual a eles. Eu crio uma identidade
baseada no quanto eu sou igual aos outros. Onde é que eu
me distingo das demais pessoas por características
próprias, que ninguém mais possua? É no meu corpo. Se
alguém me pedir uma identificação eu posso
naturalmente responder que eu sou o brasileiro ou o
corinthiano o que é válido se não houver outro
brasileiro ou corinthiano nas proximidades mas eu
posso ter como resposta: "muito bem, mas eu também
sou. Logo somos a mesma pessoa, certo?". É claro
que não. O que eu posso oferecer como identificação
positiva de mim mesmo? Uma impressão digital, por
exemplo. Uma foto da minha íris, ou um exame de DNA.
Tudo são características do meu corpo, partes de meu
corpo que me dão uma identidade única em todo o
universo. Não existem dois indivíduos com a mesma
impressão digital. Não existem duas pessoas com as
mesmas características corporais. Cada corpo é
diferente e essa diferenciação é produzida pelas
forças lunares. A Lua simbólica nos lembra essas
forças que criam cada corpo diferente dos demais, cada
floco de neve diferente de todos que já existiram ou que
existirão, cada átomo diferente de cada um dos outros,
conforme a intuição de William Crookes revelava.
(...) fim da primeira parte da fita
[Lacuna de cerca de 20 minutos?]
Resumo do assunto tratado na lacuna:
Nossa natureza corporal e nossa
natureza mental são duas metades que, quando desprovidas
da presença integradora do mercúrio filosófico, são
totalmente incompatíveis entre si. O corpo caminha numa
direção e a mente caminha em outra.
Nossa identidade consciente e
nossa identidade corporal se separam, dando-nos uma
expressão falsa e artificial.
A busca da integração das
naturezas opostas é a essência do trabalho do
alquimista. No entanto essa busca não acontece apenas
dentro da oposição entre o solar e o lunar em nossa
estrutura. Dentro da própria natureza da mente existe
uma dualidade, corporificada aqui pela luta entre a
emoção e a razão, e que precisa ser controlada e
colocada em equilíbrio pelo alquimista para que se
realize a sua obra. Não se confunde com a luta entre o
Sol e a Lua (o rei e o lobo que vimos há pouco), pois se
trata de dois elementos que compartilham a mesma natureza
solar da nossa metade consciente. Os alquimistas
representaram essa luta pela imagem de dois leões, um
verde e outro vermelho, em combate feroz. O controle
dessa luta eqüivale ao controle do fogo que aquece a
terra primordial e que se traduz pela realização das
transformações pelas quais ela passa até manifestar os
sinais de que está completa.
A luta entre a natureza solar e
a lunar é representada pela luta entre o leão (solar) e
o unicórnio (lunar).
A finalidade desse confronto de
naturezas dentro do eixo razão-emoção é induzir a
construção de um canal interno ligando o corpo ao
espírito individual.
[Fim da lacuna]
(...) início da segunda parte da fita
(Fernando Gramaccini falando)
.., e a mesma coisa fala o Bhagavad Gita, que é o
seguinte: "o objetivo da terapia é saber viver,
saber passar pelas coisas tristes e pelas coisas alegres
sem perder o seu equilíbrio interno". Krishna fala
a Arjuna no Bhagavad Gita o seguinte: "o verdadeiro
Yogue é aquele que não se alegra demais com as coisas
boas, nem se entristece demais com as coisas ruins".
Não come demais nem de menos, não dorme demais nem de
menos, que é o caminho do meio, de Buddha.
Esse caminho do meio, - que não é só na palavra,
porque eu venho falando do caminho do meio há vinte
anos, só que as minhas ações não seguem o caminho do
meio (vira e mexe, e eu escorrego na ponte e caio para o
lado esquerdo ou direito) -, então o que é isso? É
justamente um processo interno que não foi concluído.
As terapizações não precisam vir só em consultórios
de psicanálise. Isto é só um dos caminhos. A pessoa
pode terapizar de várias maneiras, pela oração, pela
meditação. Mas essas forças internas precisam ser
equilibradas para que esse interno, esse
"self", que é uma expressão da nossa
essência muito maior possa dirigir a nossa vida
psicológica e a gente possa falar e agir da mesma forma.
A alquimia existe de várias formas, e eu quis trazer
essa parte do Jung você chegou a comentar alguma
coisa dele. Teosoficamente falando isso são as
iniciações até chegar ao mestrado, quando a pessoa tem
uma expansão de consciência plena. Ou ao samadhi,
quando a pessoa tem uma expansão de consciência
universal. O Gopi Krishna descreve o que acontece quando
kundalini estourou na cabeça dele, ou seja, quando
kundalini subiu pela espinha e chegou ao cérebro. Ele
disse que numa fração de segundo a mente dele abarcou
todo o universo, apagou todo o processo do tempo e ele se
sentiu integrado com todo o universo. Ele disse que se
sentiu como se fosse todo o universo ou como se fosse um
grão de areia.
E isso são palavras para explicar esse processo de
expansão da consciência total. Quando, uma vez feito
esse processo da individuação e esse processo da
alquimia libera-se essa energia que, da mesma forma,
quando libera no átomo é uma explosão atômica porque
ela é nesse caso destrutiva, desencadeada sem um
caráter organizado. Mas esse processo do samadhi é um
processo, em níveis metafísicos, como uma explosão
atômica construtiva. A mente consegue quebrar os seus
próprios limites para experimentar diretamente aquela
essência última de cada um.
Acho muito interessante essa abordagem, que eu nunca
tinha visto. Eu não conhecia a alquimia desse jeito. Mas
a inteligência intelectual e a inteligência emocional
por um lado, e do outro lado a inteligência espiritual e
corporal indicam uma coisa de que hoje em dia se fala
cada vez mais. Se você não trouxer a terapia para o
corpo, você fica só no discurso.
Carlos Eduardo Para dar uma amarração final,
como o Fernando trouxe uma visão complementar bem
ilustrativa dessa visão ocidental, talvez caiba uma
informação que tenha faltado dizer.
Como nós pautamos nossa cultura muito pelo aspecto
intelectual, as nossas religiões também ganharam essa
mesma visão intelectual. E o nosso ser supremo é quase
sempre representado por uma figura masculina. O
alquimista representa essa inteligência espiritual, que
vai estar em última análise associada à divindade, por
uma figura feminina.
Quando nós examinamos a maneira como essa questão é
aceita pela população, o povo em geral tomado
coletivamente (como se diz "vox populi, vox
dei"), percebemos que para o povo não existe Deus,
mas sim a Deusa-mãe. Existe Nossa Senhora, Ísis, Shri
ou Lakshmi, que são deusas que representam o espírito
supremo. O povo não reza para Deus, reza para Nossa
Senhora, para a mãe de Deus, que é mais do que Deus.
Ela vem antes, e está justamente representando as
forças deste lado (lunar), as forças corporais e
espirituais se integrando na figura da deusa. E muitas
delas são representadas escuras, tenebrosas, associadas
à noite (o imaginário católico coloca o crescente
lunar aos pés da Virgem Santíssima) e à luz que brilha
na escuridão. São deusas encontradas nas águas pelos
marinheiros e pescadores (as Aparecidas), ou deusas
encontradas em criptas junto aos poços ou fontes
subterrâneos (as Virgens Negras). Essas são as imagens
das forças que a população normalmente associa à
divindade.
Mas nós, intelectuais, preferimos colocar barbas na
Virgem Maria e chamá-la de Deus. Essa figura masculina
é própria da visão solar, da visão intelectual da
divindade. Entre uma e outra aparece a imagem do
mercúrio filosófico que os católicos converteram em
suas hierarquias de anjos.
Vamos agora abrir espaço para perguntas.
Carlo Corabi eu teria duas colocações. Uma
é sobre o mercúrio. Como símbolo eu acho interessante
a simbologia dele por causa dessa ambivalência, dessa
ambigüidade. Primeiro por ser um metal líqüido, porque
quando se fala em metal logo vem a idéia de uma coisa
sólida. Outra por causa de sua densidade. Quem já teve
chance de manipular, ver um frasco com mercúrio, vê que
se quebra um pouco essa noção que a gente tem de peso,
pois um copinho de café de mercúrio deve pesar...
Fernando Gramaccini - ...treze vezes o peso da água.
Carlo Corabi - ... isso. Um outro aspecto é o da
coalescência. A gente pega uma gota de mercúrio,
estoura, e existe uma desorganização. E depois, se
juntarmos as gotas há o processo inverso, da fissão.
Volta a formar uma unidade. Também pode ser usado na
idéia da centelha divina, com um fragmento que sai e
retorna mantendo aquela unidade. Um outro ponto que eu
acho interessante é a questão do alquimista, que
geralmente vem à idéia como se ele fosse um agente
passivo, e fica bem claro que ele é ativo, ele participa
da reação química, senão não ocorre. Então não
adianta copiar fórmulas e procurar estudar e repetir
porque existe a participação integral.
Um terceiro ponto é que quando se fala em leis
imutáveis isso é um conceito que eu venho
estudando um pouco isso é válido dentro de um
sistema. Essas leis podem ser imutáveis, eternas, mas
com certas ressalvas. Dentro de um sistema, como é fruto
de uma resultante de forças, ela vai ter um
comportamento. Mesmo tentando repetir fórmulas em
épocas diferentes, em situações climáticas e em
situações espirituais diferentes vai haver uma resposta
diferente. Isso é o que falta um pouco na visão atual.
E eu achei interessante naquela palestra do [Rupelt]
Sheldrake (no teatro da PUC São Paulo), que está nesse
caminho, quando ele questiona essa idéia da
imutabilidade dessas leis. É só isso.
Carlos Eduardo G. Barbosa Em relação à sua
segunda colocação, a maior parte dos tratados de
alquimia estão desse lado aqui (solar). Eles servem para
a consciência do estudante. Mas é como eles dizem: isso
é só a forma externa. Você precisa descobrir o
espírito interno por trás desses símbolos, por trás
dessas palavras, dessas fórmulas. Tem que viver a
alquimia de fato. Quanto à imutabilidade das leis, isso
já está caindo por terra. Hoje se tem uma visão mais
orgânica, mais viva do universo do que se tinha há dez
anos atrás. Isso tem mudado rapidamente. O que nós
percebemos é que a visão do alquimista ressurge de uma
outra forma. Ninguém vai dizer que é a visão do
alquimista, mas inevitavelmente vamos chegar lá.
Ricardo Maffia (...) com relação àquilo
que você abordou também com relação à parte do
discipulado. Da parte da iniciação das iniciações. O
verdadeiro processo alquímico acontece com o indivíduo
que está se voltando a esses assuntos. E o aspecto mais
importante, o da cura que se dá em cima de toda uma
sintomatologia, porque nesse processo todo o indivíduo
acaba desenvolvendo neuroses, fobias, depressões, porque
como disse o nosso amigo lá - existe uma reação
química, mas química mesmo também da própria pessoa.
Seus aspectos negativos vêm para cima, vêm à tona os
seus aspectos positivos também. Como a própria madame
Blavatsky falava, não provoque os poderosos em função
do aspecto cármico do desenvolvimento espiritual. E
nesse processo que dá até uma espécie de
despersonalização, nesse sentido, a cura vem por ação
do desapego, o que na nossa palavra também um sinônimo
de desapego poderia ser a caridade. Realmente é a pessoa
pensar no próximo, porque é muito bonito, enfim, os
esotéricos sentam, comentam e falam sobre a caridade,
sobre o altruísmo, sobre a fraternidade, sobre o amor,
mas na hora em que realmente começa o processo, é aí
que eles realmente são cobrados a se posicionarem dessa
forma. É nessa hora que começa o processo de
individuação, o nascimento do "Self". É isso
o que eu queria dizer.
E obrigado por você ter organizado essa palestra.
Carlos Eduardo Aproveito o gancho do teu
comentário, muito feliz a lembrança, sobre esse aspecto
da cura provocada pelo processo alquímico, que fez que
os próprios alquimistas chamassem a sua arte de
"medicina espiritual". A alquimia é chamada
pelos próprios alquimistas de Medicina. E a
transformação que se opera é realmente muito grande,
muito intensa. O indivíduo se volta para o próximo,
para fora de si mesmo.
Isso é um fato notável, que os próprios alquimistas
sempre procuraram demostrar. A cura é tão intensa que
quando o alquimista atinge a perfeição na obra, quando
a estrela nasce na terra cultivada, o líquido que
circula e brota a partir daí, o sangue da terra (que é
vermelho como um rubi), iluminado pela presença da
inteligência espiritual, lhe dá imunidade ao próprio
envelhecimento. É o lendário Elixir da Vida Eterna (ou
da longa vida), e que é justamente a panacéia, o
remédio para todos os males. Embora não fosse o
objetivo da obra, era o indício de que os objetivos
haviam sido atingidos.
Da mesma maneira, o processo iniciático, no ponto da
iniciação final o adepto passa a desfrutar do direito
de morrer na hora em que quiser, e somente se quiser
morrer. Há talvez um pouco de fantasia nisso, mas
também um pouco de realidade. Na verdade o iniciado
teria uma vida com uma duração muito extensa, baseada
nesse princípio de que não há mais o desgaste desses
combates entre as naturezas que ficam perturbando a vida
dele.
Fernando Gramaccini Ficou uma coisa do que o
Ricardo falou, que é uma coisa que eu tenho trabalhado
muito ultimamente. Nós passamos séculos e séculos
falando no "o que fazer". É o lado direito
(solar) ali. Então as religiões trouxeram por anos,
séculos, milênios seguidos o que você tem que fazer.
Mas como você faz?
"Não sei, não quero saber, e você que se vire.
Você que vá expiar no fogo do inferno...". Ou
você acerta, não sei como, ou você vai para o inferno.
O que é o "como fazer"? É o chamado
"pulo do gato". Você disse e outros
espiritualistas falam. Mas para o seu dia-a-dia o
Krishnamurti propôs uma forma do "como fazer",
que é a auto-observação. Ele não propôs, ele
enfatizou neste século, mas isso é antiqüíssimo no
oriente. A auto-observação, uma corajosa observação
das nossas emoções e dos nossos desejos.
Eu não sou caridoso por que? Eu não preciso dar tudo
o que é meu para salvar o mundo. Isso não é a melhor
obra. Mas o pouco que eu tenho, e do pouco que eu der
para a pessoa certa, eu estou fazendo muito pelo mundo.
Tem uma metáfora que diz que um menino andava de manhã
na praia pegando as estrelas do mar que tinham sido
jogadas pelas ondas na areia e jogava de volta para o
mar. Então passou um homem e perguntou: "Por que
você está fazendo isso? Olhe a infinidade de estrelas
que estão fora do mar". E o menino respondeu:
"Pelo menos esta eu salvei". E o homem pôs-se
junto com o menino a jogar as estrelas de volta para o
mar.
Eu não preciso ser um Rockefeller para ajudar os
outros. Eu não preciso ser um Jesus Cristo para ajudar
os outros. Mas se dentro da minha medida eu fizer alguma
coisa, aí as coisas já começam no "como
fazer". Tem uma frase alquímica que diz que o
universo conspira a nosso favor. Aquela sincronicidade do
Jung é um reflexo cabal da lei dos alquimistas. O
universo conspira a nosso favor. É dando que se recebe.
Quando eu lanço uma estrela no mar, alguma coisa volta,
porque é lei.
É muito importante isso. Hoje a ciência do
comportamento moderna, nos últimos dez anos, através de
tomografias computadorizadas, através de inteligência
emocional, através da programação neurolingüística,
através de várias linhas, está nos dando o "como
fazer". E aí são processos de transformação, de
integração da pessoa consigo e com a sociedade. É por
isso que a religião, durante tantos anos, foi tão forte
e tantas guerras houveram. Porque todo mundo sabia o
"que", mas o "como"...
Pergunta Ao nível da alquimia, a parte
sutil da alquimia, que aliás os alquimistas se pudermos
observar os livros, os tratados, eles colocam as leis que
você aplicou e as leis que vocês também aplicaram, sem
essa lei, sem esse equilíbrio esse lado sutil... porque
alquimista além de trabalhar do lado físico, se ele
não trabalhar do lado sutil ele não consegue nada. E
como ele mesmo colocou há pouco, se da primeira vez ele
consegue, que atuou por lá com as transformações e com
as outras leis, às vezes ele conseguiu ali, agora. Mas
da outra vez que ele for tentar fazer com os mesmos
materiais, com as mesmas oportunidades, acaba não
conseguindo. A nível físico, porque Paracelso e outros
alquimistas dizem que a alquimia, não sei se ... de
acordo com a época, ... eles falam de três reinos: o
reino mineral, o reino vegetal e o reino hominal. Aí
fala do enxofre, do mercúrio, e fala do Sol. Eles estão
aplicados nesses três reinos de várias formas. Então
para resumir, no nosso reino, o que está sendo aplicado
aí, nós como homens, e mulheres também, nos
alimentamos com o forno oculto. Dê o alimento, dê ele
sólido. O peso, a matéria que entra, a matéria que
sai, mas a parte sutil, que é o ouro filosófico, o
espírito, o espírito católico, o espírito daquela
parte das proteínas, das vitaminas, é o que fica. É
quem faz o ouro ou o sangue, que é um dos nossos ouros
(...). E para tudo isso também ainda vemos uma outra
parte espiritual que seria o equilíbrio com as energias
sutis que nós desconhecemos em nosso corpo, como os
chakras, alguns chakras. E também temos ida, pingala, e
sushumna, a atração masculino-feminina, homem e mulher,
as leis cármicas, tudo conspira não é? E se a gente
tem o equilíbrio - não a gente separar o espírito nem
o corpo, mas juntar, fazer com que o fator
espírito-corpo se equilibre, fazer que as águas caiam
do céu e esse fogo, essas energias façam com que as
águas retornem para o céu (...) nos transformando. A
verdadeira alquimia, dizem, consiste não em transformar
o chumbo em ouro nem o estanho em prata. Mas sim
transformar o homem com espírito de barro no homem como
sendo o grande alquimista, com o espírito de ouro.
Carlos Eduardo Eu tenho certeza que, como ele,
muitos de vocês gostariam talvez de acrescentar alguma
coisa, mas chegamos ao nosso limite de tempo aqui. Então
eu queria agradecer a vocês por terem vindo. Eu lembro
que a Sociedade Teosófica é uma instituição voltada
à formação de um núcleo da fraternidade humana
universal, voltada a estimular o estudo comparado de
filosofia ciência e religião, e que busca também esse
conhecimento das forças ocultas, das leis ocultas da
natureza e do ser humano. E aqui todos são sempre bem
vindos.
Agradeço a vocês, convido todos para que estejam
aqui na próxima semana, para ouvir uma palestra sobre os
anjos. Conto com a participação de todos vocês e dou
por encerradas as atividades de hoje, agradecendo ao
Fernando por sua contribuição e ao Sandro Fortunato por
sua paciência e por nos honrar com sua visita.
Esta transcrição foi gentilmente cedida pela presidência da
Loja Teosófica Liberdade - São Paulo -
SP. Clique neste link para visitá-la!
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