Prefácio
As citações de que é composto o artigo seguinte não foram
originalmente extraídas com vistas à publicação, podendo por isso parecer algo
desconexas.
Foram primeiramente publicadas como uma Seleta
Teosófica, na esperança de que os leitores aproveitassem as sugestões e
fizessem eles mesmos seus livros de citações diárias a partir de excertos,
preservando dessa maneira um registro duradouro dos livros lidos e tornando a
sua leitura de valor prático. Seguindo este plano, o leitor poderia resumir o
essencial do livro, segundo o que lhe tivesse chamado a atenção.
O método de ler uma série de citações a cada manhã,
tentando viver durante o dia segundo as citações lidas, e meditando sobre as
mesmas nos momentos livres, também se sugere como proveitoso para o estudante
sério.
Algumas Sugestões
Práticas para
a Vida Diária
1
Levanta cedo, logo que tenhas despertado, sem ficar deitado
indolentemente na cama, meio sonolento e meio desperto. Então reza com fervor
pedindo para que toda a Humanidade possa ser regenerada espiritualmente, que
aqueles que estão lutando no caminho da verdade possam ser encorajados por tuas
preces, que trabalhem com mais ardor e que obtenham sucesso, e que tu possas
ser fortalecido e não ceder às seduções dos sentidos. Imagina mentalmente a
figura de teu Mestre em estado de Samadhi. Fixa essa imagem diante de
ti, preenche-a com todos os detalhes, pensa nele com reverência, e reza para
que todos os erros de omissão e comissão possam ser perdoados. Isto facilitará
grandemente a concentração, purificará o teu coração, e muito mais. Ou então
reflete sobre as fraquezas do teu caráter: compreende plenamente os males e os
prazeres passageiros que elas te proporcionam, e quere firmemente fazer
tudo quanto possas para não ceder a elas da próxima vez. Esta auto-análise e o
apresentar a ti mesmo perante o tribunal de tua própria consciência facilita,
em um grau até agora não-imaginado, o teu progresso espiritual. Quando
estiveres tomando banho, exercita, durante todo o tempo, a tua vontade, para
que as tuas impurezas morais sejam levadas pela água juntamente com as demais
impurezas do teu corpo. Em teu relacionamento com os outros, observa as
seguintes regras.
1. Nunca faças aquilo que não estejas comprometido a fazer
como teu dever; isto é, nunca faças qualquer coisa desnecessária. Antes de
fazer algo, pensa se é teu dever fazê-lo.
2. Nunca digas uma palavra desnecessária. Pensa nos
efeitos que tuas palavras podem produzir antes de pronunciá-las. Nunca te
permitas violar teus princípios por força de tuas companhias.
3. Nunca permitas que qualquer pensamento desnecessário ou
vão ocupe a tua mente. Isso é mais fácil de dizer do que fazer. Não podes
esvaziar tua mente de uma só vez. Por isso, no início, tenta evitar pensamentos
maus ou ociosos, antes ocupando a tua mente com a análise de tuas próprias
faltas, ou com a contemplação daqueles que são Perfeitos.
4. Durante as refeições exercita a tua vontade, de modo a
que o teu alimento seja apropriadamente digerido a fim de formar para ti um
corpo em harmonia com tuas aspirações espirituais, que não gere paixões
maléficas e maus pensamentos. Come apenas quando tiveres fome e bebe apenas
quando tiveres sede, nunca de outro modo. Se um prato especial atrai o
teu paladar, não te permitas ser seduzido a comê-lo para satisfazer aquele
desejo ardente. Lembra-te de que o prazer não existia alguns segundos antes, e
que cessará de existir alguns segundos depois; de que é um prazer transitório,
e que aquilo que agora é um prazer irá tornar-se dor se tu o ingerires em
demasia; de que dá prazer apenas à língua; lembra-te de que se te afligires em
demasia para obter tal prato, e te permitires ser seduzido por ele, não terás
qualquer tipo de pudor para consegui-lo; de que uma vez que existe outro objeto
que te possa trazer felicidade eterna, convergir teus desejos para algo
transitório é pura tolice; de que tu não és nem o corpo nem os sentidos,
e portanto o prazer e as dores que eles experimentam jamais poderão
realmente te afetar, e assim por diante. Pratica a mesma série de raciocínios
no caso de qualquer outra tentação, e ainda que venhas a falhar muitas vezes,
mesmo assim, com toda a certeza, chegarás ao êxito. Não leias em demasia. Se leres por
dez minutos, reflete por outras tantas horas. Habitua-te à solidão e a
permanecer só com os teus pensamentos.
Acostuma-te ao pensamento de que ninguém além de ti
pode dar-te assistência, e desapega-te de tuas afeições em relação a todas
as coisas gradualmente. Antes de dormir, reza como fizeste pela manhã. Faz
uma revisão das ações do dia, vê onde tu falhaste e resolve então que não
falharás nas mesmas coisas amanhã1.
2
O motivo correto para a busca do autoconhecimento é aquele
que pertence ao conhecimento e não ao eu. O autoconhecimento vale
a pena ser buscado em virtude de ser conhecimento, e não em virtude de
pertencer ao eu. O principal requisito para a aquisição do autoconhecimento é o
amor puro. Busca o conhecimento por puro amor, e o autoconhecimento finalmente
coroará o teu esforço. O fato de um estudante progredir com impaciência é a
prova evidente de que ele trabalha por recompensa, e não por amor, o que por
seu turno prova que ele não merece a grande vitória que está reservada para
aqueles que realmente trabalham por puro amor.2
O "Deus" em nós " isso é, o Espírito de Amor e Verdade, Justiça
e Sabedoria, Bondade e Poder " deve ser o nosso único, verdadeiro e permanente Amor,
nossa única confiança em tudo, nossa única Fé, em que, permanecendo
tão firme como uma rocha, podemos confiar para sempre; nossa única Esperança,
que nunca nos abandonará mesmo que tudo o mais pereça; e a única coisa que
temos de procurar obter, com nossa Paciência, esperando com contentamento até
que o nosso mau Carma tenha se extinguido, quando então o divino Redentor nos
revelará sua presença dentro de nossa alma. A porta através da qual Ele entra é
chamada Contentamento; pois aquele que está descontente consigo mesmo
está descontente com a lei que o fez tal como ele é; e como Deus é Ele mesmo
a Lei, Deus não se manifestará àqueles que estão descontentes com Ele.3 Se admitirmos
que estamos na corrente da evolução, então cada circunstância deve
ser considerada totalmente justa para nós. E o fracasso de nosso desempenho
numa linha de ação deveria ser considerado a nossa maior ajuda, pois não
podemos aprender de nenhum outro modo aquela serenidade na qual insiste
Krishna. Se todos os nossos planos fossem bem-sucedidos, então nenhum contraste
se apresentaria a nós. Também aqueles planos assim feitos, poderiam estar
baseados em nossa ignorância e, portanto, ser errôneos, de modo que a bondosa
Natureza não nos permitirá realizá-los. Não somos culpados pelo plano, mas
através da não-aceitação de sua realização, podemos adquirir demérito cármico.
Se tu, por qualquer motivo, encontra-te abatido, então, na mesma proporção, os teus
pensamentos enfraquecerão em poder. Pode-se estar confinado numa
prisão e ainda assim ser um trabalhador pela causa. Desta forma, rogo-te
para tirar de tua mente qualquer desgosto pelas circunstâncias presentes. Se
conseguires olhar para tudo isso justamente como sendo aquilo que tu4 de fato desejaste , então isso não apenas fortalecerá os teus
pensamentos, como também atuará reflexivamente sobre o teu corpo, tornando-o
mais forte.5
Agir, e agir sabiamente quando chegar o tempo da ação,
esperar, e esperar pacientemente, quando for tempo para repouso, põe o homem em
harmonia com os altos e baixos das marés (da vida), e deste modo, tendo a lei e
a Natureza como seu respaldo, e a verdade e a caridade como faróis luminosos a
lhe indicarem o caminho, ele poderá realizar maravilhas. A ignorância desta lei
resulta em períodos de entusiasmo irracional de um lado, e depressão e até
mesmo desespero do outro. O homem torna-se assim vítima de suas flutuações,
quando deveria ser o Senhor delas.6
Tem paciência, Candidato, como alguém que não teme
fracassos nem corteja êxitos.7
A energia acumulada não pode ser aniquilada, deve ser
transferida para outras formas, ou ser transformada em outros tipos de
movimento; ela não pode permanecer para sempre inativa e ainda assim continuar
a existir. É inútil tentar resistir a uma paixão que não podemos
controlar. Se a sua energia acumulada não for conduzida para outros canais,
crescerá até que se torne mais forte que a vontade, e mais forte que a razão. Para
controlá-la, tu tens de conduzi-la para um outro canal superior.
Desse modo, o amor por alguma coisa vulgar pode ser modificado, transformando-o
em amor por algo elevado, e o vício pode ser transmutado em virtude, se o
seu curso for alterado. A paixão é cega, vai para onde for conduzida, e a
razão é um guia mais seguro para ela que o instinto. A ira contida (ou o amor)
acabará por descobrir algum objeto sobre o qual descarregar sua fúria,
de outro modo poderá produzir uma explosão que destruirá o seu agente; após
a tempestade vem a bonança. Os antigos diziam que a Natureza tem aversão ao
vácuo. Não podemos destruir ou aniquilar uma paixão. Se ela for expulsa, uma
outra influência elemental tomará o seu lugar. Não deveríamos, portanto, tentar
destruir o inferior sem pôr algo em seu lugar, mas de fato deveríamos
substituir o inferior pelo superior; o vício pela virtude, e a superstição pelo
conhecimento.8
3
Aprende que não há cura para o desejo, que não há cura para
a busca de recompensa, que não há cura para o sofrimento de estar ansioso por
algo, a não ser fixando a visão e a audição naquilo que é invisível e
inaudível.9
O homem tem de acreditar na sua capacidade inata de
progredir; não deve se atemorizar ao considerar a grandeza da sua natureza
superior nem se deixar arrastar pelo seu eu inferior ou material.10
Todo o passado nos mostra que as dificuldades não devem
servir de desculpa para o desânimo, muito menos para o desespero, de outro modo
o mundo não teria as muitas maravilhas da civilização.11
A força de vontade para seguir adiante é a primeira
necessidade daquele que escolheu seu caminho. Onde pode ela ser encontrada"
Olhando-se ao redor não é difícil ver onde outros homens encontram sua força. A
sua fonte é a convicção profunda.12
Abstém-te porque é correto o abster-se " não para te conservares
limpo.13
O homem que luta contra si mesmo e vence a batalha só pode
fazê-lo quando sabe que naquela luta ele está fazendo aquilo que vale a pena
ser feito.14
"Não resistas ao mal", isto é, não te queixes nem te
irrites com as vicissitudes inevitáveis da vida. Esquece de ti mesmo (servindo
aos outros). Se os homens maltratam, perseguem ou enganam os seus semelhantes,
por que resistir" Na resistência criamos males ainda maiores. 15
O trabalho imediato, qualquer que seja, tem implícito o
clamor do dever, e a sua relativa importância ou não-importância não deve ser,
em absoluto, considerada.16
O melhor remédio para o mal não é a repressão, mas a eliminação
do desejo, e isso pode ser melhor alcançado mantendo-se a mente constantemente
fixa em coisas divinas. O conhecimento do Eu Superior é solapado quando se
deixa a mente comprazer-se com os objetos dos sentidos desgovernados.17
Nossa própria natureza é tão vil, orgulhosa, ambiciosa, e
tão cheia de seus próprios apetites, julgamentos e opiniões, que se as
tentações não a dominassem, ela se deterioraria irremediavelmente; portanto
somos tentados até o fim para que possamos conhecer a nós mesmos e ser
humildes. Sabe que a maior das tentações é a de não ter tentação alguma, por
esse motivo alegra-te quando elas te assaltarem , e com resignação, paz e
constância, resiste a elas.18
Sente que tu não tens que fazer nada para ti mesmo, mas que
certas tarefas são designadas para ti pela Divindade, as quais tu tens de
cumprir. Deseja Deus, e não algo que Ele possa proporcionar-te.19
Tudo o que deva ser feito, tem de ser feito, mas não
com o propósito de satisfazer-se com o fruto da ação.20
Se todas as ações de uma pessoa forem executadas com a
plena convicção de que não têm qualquer valor para o agente, mas que devem ser
efetuadas simplesmente porque têm de ser feitas " em outras palavras,
porque está em nossa natureza agir " então a personalidade egoísta em nós se
enfraquecerá cada vez mais, até que chegue a apaziguar-se, permitindo ao
conhecimento revelar o Eu Verdadeiro a brilhar em todo seu esplendor. Não se
deve permitir que a alegria ou a dor afaste a pessoa de seu firme propósito.21
Até que o Mestre te escolha para vir a Ele, esteja
com a Humanidade, trabalhando de modo altruísta pelo seu progresso e evolução.
Somente isto pode trazer verdadeira satisfação.22
O conhecimento aumenta na proporção de seu uso "
isto é, quanto mais ensinamos mais aprendemos. Portanto, Buscador da Verdade,
com a fé de uma criancinha e a vontade de um Iniciado, compartilha
daquilo que tens com aquele que nada possui para confortá-lo em sua jornada.23
Um discípulo tem de reconhecer de maneira inequívoca que a
própria idéia de direitos individuais nada mais é que a manifestação da
natureza venenosa da serpente do eu. Ele jamais deverá considerar outro homem
como alguém passível de ser criticado ou condenado, nem tampouco poderá o
discípulo elevar sua voz em autodefesa ou desculpa.24
Nenhum homem é teu inimigo; nenhum homem é teu amigo. Todos
são igualmente teus instrutores.25
Não mais se deve trabalhar para ganhar qualquer benefício,
temporal ou espiritual, mas tão somente para cumprir a lei da existência que é
a justa vontade de Deus. 26
4
Não vivas nem no presente nem no futuro, mas sim no eterno.
A gigantesca erva daninha (do mal) lá não pode florescer; a própria atmosfera
do pensamento eterno apaga esta mancha da existência.27 A pureza
do coração é uma condição necessária para o atingimento do "Conhecimento do
Espírito". Há dois meios principais pelos quais essa purificação pode ser
atingida. Em primeiro lugar, afasta persistentemente todo mau pensamento; e em
segundo, mantém a mente tranqüila sob quaisquer condições, nunca te agitando
ou te irritando por qualquer coisa. Descobrir-se-á, assim, que estes dois
meios de purificação são melhor estimulados pela devoção e pela caridade.
Não devemos nos manter ociosos, sem tentar fazer alguma coisa para
progredir, só porque não nos sentimos puros. Que todos tenham aspirações, e
que trabalhem com o devido empenho; no entanto, devem trabalhar no reto
caminho, cujo primeiro passo é purificar o coração.28
A mente precisa de purificação sempre
que sentir ira ou que uma mentira seja contada, ou as faltas
de terceiros sejam desnecessariamente reveladas; sempre que algo seja dito
ou feito com o propósito de bajulação, ou que alguém seja enganado pela insinceridade
de uma palavra ou ação.29
Aqueles que aspiram pela salvação devem evitar a
luxúria, a ira e a cobiça, e devem cultivar uma corajosa obediência às
Escrituras, estudar Filosofia Espiritual, e cultivar a perseverança na
sua realização prática.30
Aquele que se deixa levar por motivos egoístas não
pode entrar num Céu onde os motivos pessoais não existem. Aquele que não se
preocupa com o Céu, mas que se sente contente onde se encontra, já está no Céu,
enquanto que o descontente irá clamar pelo Céu em vão. Não ter desejos pessoais é estar livre e feliz, e a palavra "Céu" não pode significar
outra coisa a não ser um estado no qual a liberdade e a felicidade existam. O
homem que pratica ações benéficas motivado por uma expectativa de recompensa
não fica feliz a não ser que a recompensa seja obtida, e uma vez obtida essa
recompensa, a sua felicidade cessa. Não pode haver descanso e felicidade permanentes
enquanto houver algum trabalho a ser feito, e que não tenha sido realizado,
sendo que o cumprimento do dever traz sua própria recompensa.31
Aquele que se considere mais santo que os outros,
aquele que tenha qualquer orgulho por estar isento de vícios ou insensatez,
aquele que se crê sábio, ou de qualquer maneira superior ao seu próximo, está
incapacitado para o discipulado. Um homem tem que se tornar como que uma
criancinha antes de poder entrar no Reino dos Céus. A virtude e a sabedoria são
coisas sublimes, mas se elas criarem orgulho e uma consciência de
separatividade em relação ao restante da Humanidade, então serão apenas as
serpentes do eu reaparecendo de uma forma mais sutil. O sacrifício ou a entrega
do coração do homem e suas emoções é a primeira das regras; envolve
"o atingimento de um equilíbrio que não pode ser perturbado pelas emoções pessoais."
Põe, sem demora, tuas boas intenções em prática, nunca permitindo que nem
sequer uma delas permaneça apenas como uma intenção. Nosso único rumo verdadeiro
é deixar que o motivo para a ação esteja na ação em si mesma, jamais na sua recompensa;
não ser incitado à ação pela expectativa do resultado, e nem tão pouco ceder à
propensão à inércia.
Através da fé32 o coração é purificado das paixões e da insensatez;
daí surge o domínio do corpo, e, por último, a subjugação dos sentidos.33
As características do sábio iluminado são, em
primeiro lugar, que ele está liberto de todos os desejos,34 e sabe
que somente o verdadeiro Ego ou Supremo Espírito é bem-aventurança, e que tudo
o mais é dor. Em segundo, que ele está livre de apego ou repulsão com
relação a qualquer coisa que lhe aconteça, e que age sem intenção. Finalmente,
vem a subjugação dos sentidos, que é inútil, e freqüentemente
prejudicial, dando origem à hipocrisia e ao orgulho espiritual, quando
destituída do segundo, e que por sua vez não tem muita utilidade quando destituída
do primeiro.35
Aquele que não pratica o altruísmo, aquele que não
está preparado para dividir sua última porção36 com
alguém mais pobre ou mais fraco do que ele, aquele que negligencia em ajudar
seu próximo, qualquer que seja sua raça, nação, ou credo, quando e onde quer
que encontre sofrimento, e que faz ouvidos moucos ao clamor da miséria
humana; aquele que ouve uma pessoa inocente ser caluniada, e que não toma a sua
defesa como defenderia a si mesmo, não é um teósofo.
5
Ninguém age corretamente ao abandonar o cumprimento
dos inequívocos deveres da vida, baseados no mandamento Divino. Aquele que
cumpre seus deveres por pensar que se eles não forem cumpridos algum
malefício lhe sobrevirá, ou que o seu cumprimento removerá dificuldades do seu
caminho, trabalha pelos resultados. Os deveres devem ser cumpridos simplesmente
por terem sido mandados por Deus, que pode a qualquer momento ordenar que se
lhes abandone. Enquanto não tivermos reduzido a inquietação da nossa natureza à
tranqüilidade, teremos de trabalhar, consagrando à Deidade todos os frutos de
nossa ação e atribuindo-Lhe o poder de executar as tarefas corretamente. A verdadeira
vida do homem é paz em identidade com o Supremo Espírito.
Esta vida não é trazida à existência por qualquer ato
nosso, é uma realidade, "a verdade", e é completamente independente de nós. A
compreensão da irrealidade de tudo que parece se opor a esta verdade é uma nova
consciência e não uma ação. A libertação do homem não está de modo algum
relacionada às suas ações. Na medida em que as ações promovem a compreensão de
nossa total inabilidade para emancipar a nós mesmos da existência condicionada,
elas são úteis; após a compreensão desse estágio, as ações se tornam mais
obstáculos do que auxílio. Aqueles que trabalham em obediência aos mandamentos
Divinos, sabendo que o poder para assim trabalhar é um dom de Deus, e que não é
uma parte da natureza autoconsciente do homem, alcançam a liberdade em relação
à necessidade de ação. E então o coração puro é preenchido pela verdade, e é
percebida a identidade com a Deidade. O homem tem de primeiramente se livrar da
idéia de que ele realmente faz alguma coisa, sabendo que todas as ações
ocorrem nas "três qualidades da natureza"37 e de modo algum na
alma.
Então ele tem de estabelecer todas as suas ações na devoção.
Isto é, sacrificar todas as suas ações ao Supremo e não a si mesmo. Ou ele
próprio se arvora no Deus a quem são consagrados os seus sacrifícios, ou os
consagra ao outro verdadeiro Deus " Ishvara; e todos os seus atos e
aspirações são dedicados ou para si mesmo ou para o Todo. Aqui se evidencia
a importância do motivo. Pois se ele realiza grandes obras de valor, ou de
benefício para a Humanidade, ou adquire conhecimento para poder dar
assistência a seu próximo, e é movido a isso meramente porque pensa que assim
alcançará a salvação, ele está agindo apenas para seu próprio benefício, e
está portanto consagrando sacrifícios para si mesmo. Desta forma, ele
tem de devotar-se internamente ao Todo; sabendo que ele próprio não é o
agente das ações, mas a mera testemunha delas. Desde que está em um corpo
mortal, ele é afetado por dúvidas que irão brotar repentinamente.
Quando elas de fato surgem, é porque ele ignora algo. Ele deve para tanto ser
capaz de dispersar a dúvida "pela espada do conhecimento." Porque se ele dispõe
de uma resposta pronta para alguma dúvida, nesta mesma proporção ele a
dissipará. Todas as dúvidas vêm da natureza inferior, e jamais em
qualquer caso da natureza superior. Por isso à medida que ele cresce em devoção
é capaz de perceber cada vez mais claramente o conhecimento que reside em sua
natureza Sattvica (bondade). Pois está dito: "Um homem que seja perfeito
em devoção (ou que persiste em seu cultivo) espontaneamente descobre o
conhecimento espiritual em si mesmo com o passar do tempo". E também: "Um
homem com a mente cheia de dúvidas não desfruta nem deste mundo nem do outro (o
mundo dos Devas), nem da beatitude final." A última frase é para
destruir a idéia de que se há em nós esse Eu Superior ele irá, mesmo se formos
indolentes e cheios de dúvidas, triunfar sobre a necessidade de conhecimento,
conduzindo-nos à beatitude final junto com o fluxo evolutivo de toda a
Humanidade.38