O CAMINHO DO LIBERTAÇÃO
Geoffrey Hodson
(Teósofo inglês)
Uma das grandes necessidades da época atual é um sistema
regular de pensamento reflexivo e de apropriado treinamento espiritual para
todos os homens. Esta parece ser a solução, em realidade a única solução, dos
problemas do momento, não somente para aqueles que aspiram a uma vida
espiritual elevada, mas também para os dirigentes e povos de todas as nações do
mundo.
No Ocidente estamos imersos em uma febril atividade e
vivemos em tal estado de ruído, excitação e perseguição egoísta do prazer que
esquecemos completamente as realidades internas. Neste fato se encontra a
explicação de todas as dificuldades do mundo. A natureza, entretanto, nos
conduzirá inapelavelmente como o cavaleiro guia a seu cavalo, se nós não
trocarmos totalmente o método e propósito de nossas vidas. Os cataclismos, as
guerras e as lutas sociais e operárias que são a característica de nossa época,
não são outra coisa que não advertências da natureza a fim de que nos
detenhamos em nosso caminho e voltemos nossa atenção em direção da vida.
A prática da meditação é um dos caminhos para nos liberar
das moléstias, tristezas e dificuldades da vida; precisamente a liberação que
todos os homens procuram. Para que seja completa e perdurável essa liberação
deve sê-lo em um triplo sentido. Em primeiro lugar, temos que libertar a nossos
próprios poderes internos.
Aqueles que aspiram à vida espiritual não devem esperar a
pressão das circunstâncias externas para despertar esse poder inato; mas sim
devem aprender a liberá-lo e a utilizá-lo deliberadamente. A meditação é o meio
para alcançar essa liberação.
Há uma segunda classe de liberação. Detrás e por cima
daquilo que desenvolvemos, está o poder divino, que é nossa existência real. É
a força de nossa Divindade imanente. É o Deus que somos nós mesmos. Enquanto
nossa atenção esteja dirigida para fora, ao externo, ao temporal e ao
cambiante, o Deus dentro de nós permanecerá adormecido. Está em nossas mãos
despertá-lo conscientemente e liberar agora nossas possibilidades divinas. Se
queremos alcançar a meta é indispensável que o façamos assim. Necessitamos
todos os nossos poderes e a experiência que possuímos para alcançar com
segurança a ‘outra margem’ neste período da evolução humana.
Consolemo-nos, entretanto, recordando que não temos que
criar energia. A única coisa que temos que aprender é liberá-la. A ciência tem
descoberto em um simples átomo forças tão grandes que caso fossem liberadas
destruiriam um continente. Qual não será, então, o poder da alma humana? Em
cada um de nós há uma energia incalculável. Cada um de nossos corpos oculta uma
parte de uma energia que aqui, no plano físico, se manifesta muito pouco. O
primeiro passo rumo à segunda liberação é tratar de compreender no que consiste
este poder; segui-lo passo a passo até sua origem; encontrar nosso caminho para
o interno através dos corpos que velam sua luz, passar mais à frente do corpo
emocional ao mental, pelo mental ao Ego [Eu Superior], onde encontramos poder,
paz e gozo além de toda compreensão humana. Em realidade, não há limite quanto
às alturas a que podemos aspirar. Podemos chegar ao mais íntimo do coração do
Logos e nos mergulhar Nele. Essa é, em realidade, a meta da meditação: o
descobrimento da Fonte do Poder e a união com ela.
Em terceiro lugar, não procuramos nos liberar das tristezas
e dificuldades da vida, da natureza imperfeita da existência humana, cheia de
um sofrimento que parece interminável, e com tão pouca felicidade que parece
insegura? Não caminhamos às cegas em um mundo onde a dor parece preponderar,
procurando sempre o prazer constante sem jamais encontrá-lo? Procuramos nos
liberar da dor, a tristeza e a incerteza; procuramos um bem-estar que seja
eterno e uma tranqüilidade que seja inalterável; procuramos, em uma palavra, a
libertação eterna.
Há um meio de escapar das penúrias da vida terrestre, de
suas limitações, da sensação de incapacidade, da sensação de ter poderes que
não podemos expressar e dos desenganos que continuamente se nos apresentam na
vida. Este meio é aprender logo as lições que a dor e as tristezas ensinam e
nos recolher em nosso interior, nos afastando deles para o cerne da realidade.
Esses males têm, naturalmente, sua utilidade, são nossos
professores. Venceremo-los afastando-nos deles, não lutando continuamente
contra eles. Este último método vem sendo praticando desde idades sem conta e
que se perdem nas brumas do tempo. Não nos protegemos desses males
resistindo-os, pois ao fazê-lo intensificamos seu poder e nos pomos mais
completamente sob seu domínio. Devemos nos distanciar de todas as dificuldades
até que as vejamos em sua devida perspectiva, como sombras efêmeras, projetadas
por nossa personalidade na tela do tempo e do espaço. Temos que deixar de olhar
a multiplicidade de sombras e encarar a Luz única. Esta grande ‘conversão’ se
consegue por meio da meditação. Com o pensamento devemos seguir nosso caminho
até o verdadeiro centro de nosso ser. Ali encontraremos a luz eterna brilhando.
Ali encontraremos a paz que é inalterável e que está ‘além de toda
compreensão’. Não há outro caminho. Todos os fenômenos cambiantes da vida, ou
melhor dizendo, todas as novidades passageiras do mundo, especialmente as
experiências que nos produzem dor, existem para nos ensinar a olhar para
dentro. Unicamente ali encontraremos o Reino da Felicidade.
Se necessitarmos um maior incentivo, o encontraremos no
conceito de que só poderemos ensinar a outros o caminho da libertação quando
nós mesmos o tenhamos encontrado. Por muito que nos compadeçamos de nosso
irmão, por muito que trabalhemos para aliviar os males do mundo, não seremos
verdadeiros auxiliares, reformadores ou mestres até que tenhamos aprendido a
nos recolher no seio dessa paz eterna, onde poderemos vislumbrá-la tudo em sua
verdadeira perspectiva, alcançar a sabedoria e liberar o único poder capaz de
nos converter em verdadeiros salvadores de homens.
Quando nós mesmos tenhamos encontrado e cruzado o portal,
poderemos guiar a nossos irmãos, mas não antes. Se observarmos os olhos dos
grandes seres do mundo, veremos neles uma serenidade, uma felicidade e uma
calma que nada pode perturbar. Eles entraram no Jardim da Felicidade e as
tristezas do mundo não lhes alcançam pessoalmente, por muito que se compadeçam
dos outros.
Como alcançar isto que todos desejamos? Existem cinco
princípios essenciais, cuja consideração pode nos indicar o caminho:
1.— Todo aquilo que procuramos se encontra em nós mesmos.
Deixemos de procurar a felicidade no externo; pelo
contrário, tratemos de encontrar o coração de nosso próprio ser, onde
unicamente jaz a solução dos problemas da vida e o caminho da felicidade e paz
eternas.
2.— É necessário tranqüilidade absoluta para que a ‘Voz do
Silêncio’ seja ouvida e a luz eterna que sempre brilha seja percebida.
Estamos sempre em presença de Deus. Os planos espirituais
mais elevados não estão afastados no espaço, mas sim estão aqui mesmo. A voz de
Deus ressoa sempre. Não ouvimos Sua voz, nem percebemos Sua luz, porque estamos
completamente absorvidos em nós mesmos e nos aturdimos com nosso próprio ruído.
Isto se aplica igualmente ao indivíduo e às nações. Aquele que aspira à vida
espiritual deve retirar-se de todo isso; não deve se deixar arrastar pelo
torvelinho da vida humana moderna, nem ser dominado pelas correntes de
pensamento do mundo. De vez em quando é bom retirar-se de tudo isto e
estabelecer dentro de si mesmo um centro de equilíbrio e paz. Então se ouvirá a
Voz, será percebida a Luz e começarão a afluir a glória e a serenidade dos
mundos superiores.
Assim sendo, o silêncio é o segundo grande princípio.
“Tende quietude e saiba que sois Deus”, disse o salmista. Um poeta moderno
afirmou: “Quão raro é encontrar uma Alma bastante tranqüila para ouvir a voz de
Deus”, e também: “Permanece tranqüilo diante de seu Deus e deixa que Ele te
molde.”
3.— Na quietude se produzirá a expansão de consciência.
Tendo se recolhido a si mesmo, tendo alcançado a
tranqüilidade, concentremos nossos pensamentos na contemplação das coisas
eternas. Deixemos que Deus penetre mais em nossas vidas. Esforcemo-nos em
alcançar um conceito de Sua Glória e em imaginar Sua natureza. Então, nossa consciência se expandirá e nos encontraremos n´Ele e O descobriremos em nós.
4.— Nossos corpos devem purificar-se, a fim de que possam
expressar a beleza, o esplendor, a expansão e a visão que nossa meditação revela.
O corpo físico deve refinar-se perfeitamente. Os efeitos
hereditários de comer carne em excesso e a rudeza geral das últimas gerações
têm que eliminar-se por meio de dieta e vidas puras. Um grande Mestre disse que
nossos corpos devem estar livres ‘até da mais pequena partícula de impureza’. A
impureza física tem sua contrapartida no corpo emocional e também na mente; por
conseguinte, é três vezes indesejável. Nossas emoções têm que ser igualmente
purificadas e cultivadas; devemos refinar nossa mente, dominar sua tendência a
separatividade, ao egoísmo e à crítica, e aprender a pensar em termos de
unicidade. Desta maneira os corpos sutis se farão sensitivos, puros, belos e
translúcidos à luz interna.
5.— A solução de todos os problemas se encontra na
compreensão da Unidade de toda a Vida.
Anjo, homem, animal, vegetal e mineral são todos Um. A
mensagem que temos para o mundo, que tem caído na ‘grande heresia’ da
separatividade, é o da Unidade. Para transmitir esta mensagem não precisamos
ser gigantes intelectuais capazes de escrever, falar ou organizar; porque, se
tivermos um coração reto e a atitude devida e nós mesmos alcançamos, em certa
medida, a compreensão da unidade, todos podemos ajudar. Todos podemos transmitir
a mensagem constantemente em nossa vida cotidiana. Tudo o que precisamos é
caridade e um coração puro, um determinado poder de concentração e uma vontade
que não arredem ante os obstáculos.
Temos que
romper as amarras do eu inferior separado e temos que dedicar toda nossa vida
ao serviço de nossos irmãos. Uma vez que tenhamos vislumbrado a esplêndida
visão da unidade da vida, nenhuma dor terrestre poderá nos machucar. O gozo de
trabalhar com os grandes dirigentes e Mestres da humanidade perdurará em nossos
corações e brilhará em nosso olhar. Eles nos ajudarão a nos desenvolver, a fim
de que cheguemos a ser servidores mais eficientes e mais inteligentes. Mediante
Sua condução encontraremos a libertação e por Seu poder guiaremos à humanidade
para a Paz.